sábado, julho 23, 2011

Largo do Poeta, na cidade de Acaraú

Vicente Freitas, visita ao Largo do Poeta

Inaugurado no final do ano de 2008, como um presente de Natal para o povo de Acaraú e visitantes, o Largo do Poeta, homenagem aos filhos ilustres de Acaraú, Padre Antônio Thomaz, Dimas Carvalho e o Poeta Nicodemos Araújo, entre outros. Hoje está quase abandonado.


O Largo do Poeta é uma praça de lazer para as famílias, passeios de namorados, encontros de amigos, um ótimo ambiente para quem gosta de natureza e tranquilidade. Era emocionante ver as pessoas conversando, lendo um livro sentado nos bancos, a criançada comendo pipoca, algodão doce, iluminação e guarda municipal dando segurança e protegendo o bem público. Era uma verdadeira organização em um dos cartões postais mais belos de Acaraú.

Tudo isso foi para o fundo do poço, ou melhor, para o fundo do mangue. Quando são indagados sobre o abandono ao Largo do Poeta, os administradores dizem apenas que não receberam a praça, “como outras que também estão abandonadas”, e que não podem dar manutenção. 

Veja o antes e agora do Largo do Poeta





  
  
  
  
  
  
  
  

 
  
  
  
  
  
  
  

 
  
 










Com a visita que fizemos hoje, ao largo do Poeta, percebemos que o ambiente já está sendo revitalizado. Torcemos pela preservação desta bonita e saudável área de lazer, na cidade de Acaraú.



sábado, julho 16, 2011

São Vicente de Paulo


24 de abril de 1581, na aldeia Pouy, sul da França
nasce uma criança. Batizada no mesmo dia. 
Camponês de nascimento, pastor na infância,
padre, postulante em Roma, escravo.
– chamou-se em vida Vicente de Paulo.
Naquela França convulsionada pela ambição,
ele encontra o seu campo de batalha.
Nada de embarcar para terras de Ásia e África,
bastava olhar no entorno – gentes tão distantes de Deus.
Ensino de catecismo, prédicas singelas
– dessas pequenas missões
nascia a grande congregação dos Lazaristas,
espalhadas mais tarde pelo mundo inteiro.

Criou então a sociedade das Senhoras da Caridade
– damas fidalgas e burguesas – 
apesar de tão altas protetoras, padeciam de um vício básico:
o fato de continuarem grandes damas.
São Vicente queria uma caridade direta:
A ferida que se lava e se cura,
a cama que se troca, a fome que se acode na própria cabana.
Foi daí que nasceu a grande revolução Vicentina.
Um novo tipo de comunidade religiosa
cuja direção foi entregue à Luiza de Marillac.

Até então a vocação religiosa feminina
só conhecia a contemplação e o claustro.
São Vicente descobriu uma fórmula inédita:
nada de freiras emparedadas em conventos,
as suas seriam militantes,
praticando a caridade com as próprias mãos. 

Mais de trezentos anos se passaram:
de Richelieu a Luís, o sol, que resta?
Pedras mortas, páginas de livros.
Mas a obra de Vicente de Paulo está aí 
– viva, palpitante, eterna.

E já temos como certo,
quando começarem as viagens interplanetárias,
– onde quer que se fixe o homem pelos céus além,
logo há de aparecer uma Irmã de Caridade,
a assistir ‘orfãozinhos’ e ‘desvalidos’ no novo planeta.

– 27 de setembro de 1660, morria, em Paris, um santo.

Vicente Freitas

Igreja de São Vicente

São Vicente, levita bondoso,
Alma feita de amor e de luz,
Teu exemplo de fé, portentoso,
Ao mais belo caminho conduz.

Na Vila de Santa Cruz, hoje cidade,
Triunfou teu sublime ideal,
Os teus filhos de boa vontade
Construíram esse templo, sem igual.

Emílio Fonteles da Silveira,
João Venceslau de Araújo,
A Congregação Vicentina, altaneira,
Construíram esse templo, cujo

Os favores do bem derramando
Sobre nós, em torrentes de luz,
Embeleza esta terra, imanando
Pela glória imortal de Jesus.

Vicente Freitas

sexta-feira, julho 15, 2011

Corrupção na Prefeitura de Bela Cruz

Bela Cruz é mais uma cidade do Ceará envolvida em corrupção 

O prefeito Daniel Adriano e o ex Eliésio Adriano
Uma verdadeira avalache de denúncias estaria relacionada ao poder público municipal de Bela Cruz, no noroeste cearense, nos últimos nove anos.

Falsificação de documentos, depoimentos "armados" para derrubar prefeitos e garantir espaço em futuras administrações, servidor que acumularia 36 cargos na administração municipal, são alguns dos problemas que o município enfrenta.

José Mário Carvalho Filho, é ex-presidente da Comissão de Licitação de Bela Cruz. Ele denuncia ter sido alvo de falsificação depois que deixou o cargo.

Veja o depoimento do Batelão
Ele denúnciou à TV Diário que descobriu o ocorrido depois que tomou conhecimento do documento do Tribunal de Contas dos Municípios, cobrando a quitação de uma dívida relativa a multa de transporte.

O promotor da comarca, Eunatan Júnior, confirmou que o Ministério Público recebeu a denúncia, mas a promotoria prefere não revelar o susposto responsável pela fraude por conta das investigações.

Sobrinho assume o cargo
José Mário vai além e afirma que o caso seria resquício da administração do ex-prefeito Eliésio Rocha Adriano, do PMDB. Ele faria parte de um esquema que culminou com o afastamento do prefeito Pedro Rogério de Morais, em 2010.

Assim, por decisão judicial, quem assumiu o cargo foi o segundo mais votado nas eleições de 2008, Daniel Adriano, sobrinho de Eliésio Adriano.

Fonte:TV Diário
Veja aqui a defesa do Cachimbão

quinta-feira, julho 14, 2011

Quem será investigado - Bela Cruz está na lista

O esquema que levou à decretação da prisão de dois prefeitos tem raio de ação muito maior. Em 80 municípios, as prefeituras fizeram contratos com a rede de corrupção. Todas serão alvo de investigação, conforme promotor

As investigações que resultaram nos mandados de prisão do prefeito de Senador Pompeu e outras 30 pessoas, na última terça-feira, podem surtir efeito dominó em dezenas de municípios. Levantamento feito pelo O POVO com informações do Portal da Transparência, disponibilizadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), identificou que pelo menos 80 das 184 prefeituras do Ceará já contrataram os serviços das empresas envolvidas no esquema do empresário Raimundo Morais Filho, o Moraisinho, que fraudava licitações.

Pelas informações do Portal da Transparência, as prefeituras contrataram os serviços destas empresas de 2006 até 2010. “Não vou dizer que estão no mesmo grau de comprometimento de Senador Pompeu, mas todas elas certamente serão alvo de investigação”, garantiu o promotor Luiz Alcântara, da Procuradoria dos Crimes Contra a Administração Pública (Procap).

Ele prefere não estimar o valor do rombo deixado pelo grupo, afirmando que qualquer estimativa “é temerária”. Em Nova Russas, o prefeito Marcos Alberto Martins Torres (PSC) já foi preso. O prefeito de Senador Pompeu teve prisão preventiva decretada. Segundo Alcântara, as investigações constataram que é o mesmo grupo atuando em vários municípios, com o mesmo “modus operandi” para desviar dinheiro.

Esse é, portanto, só o “pequeno começo”. “Em todos os municípios em que o grupo do Raimundo Morais atuou existe o comprometimento de servidores e agentes políticos com o crime organizado”, disse. Agora, ele garante que o Ministério Público atuará “de forma incansável” para identificar os autores, beneficiários e representará pela prisão preventiva de todos.

Além disso, a Procuradoria buscará ressarcimento de tudo aquilo que foi desviado de todos os municípios.

Ele afirma que, uma vez decretados os mandados de prisão, é fundamental que os acusados sejam presos o mais rápido possível, para que não destruam as provas, para não ameaçarem nem constrangerem testemunhas e não continuem a desviar recursos públicos.

O POVO tentou ontem falar com a prefeita de General Sampaio, Eliene Brasileiro, presidente da Associação dos Municípios e Prefeitos do Estado do Ceará (Aprece) pelo celular. Três ligações foram atendidas, mas a pessoa não dizia nada e depois a ligação caía. Em seguida, o celular foi desligado. O POVO tentou também falar com a prefeita por meio da chefe de gabinete da Prefeitura. Segundo ela, a prefeita estaria na zona rural de General Sampaio e, por isso, incomunicável. Ela orientou que a reportagem enviasse um e-mail à prefeita, mas até o fechamento da matéria, ela não havia respondido. General Sampaio é um dos municípios da lista.


ENTENDA A NOTÍCIA

Muitos prefeitos devem estar preocupados com as investigações do Ministério Público. Pelo menos 80 já contrataram os serviços das empresas envolvidas no esquema do empresário Raimundo Morais Filho.

Fonte: jornal o povo

domingo, julho 10, 2011

Um livrinho, um poetinha

Andrea Trompczynski
Quando pus os olhos a primeira vez em Garoto de Ipanema, de Alex Solnik, pensei: "que livrinho...", da mesma maneira que pensava, anos atrás, ter sido Vinícius de Moraes somente "um poetinha". É uma regra: nas primeiras vezes que se lê Vinícius de Moraes, geralmente durante um grande amor aos dezesseis ou dezessete anos, ele é perfeito. Depois, alguém vai certamente dizer que ele é doce demais, amigo demais, poeta demais. Virá a época de desgostos, Augusto dos Anjos ou Arthur Rimbaud, sucedido de um longo tempo sem ler poesia, com a única explicação de que dói. Um dia pode-se voltar a ela, que os cortes já estão costurados com linha forte e muitos são apenas cicatrizes. Reler Vinícius aos trinta anos é diferente, ele assume proporções não vistas antes e umas palavras que pareciam singelas tomam todo significado. Ao ler sobre o Vinícius, impreterivelmente se pensa: "amei pouco".

São entrevistas ou depoimentos de Portinari, Jorginho Guinle, Oscar Niemeyer, Haroldo Costa (o eterno Orfeu), Lan, Ferreira Gullar, Miúcha, Sérgio Cabral, Zélia Gattai, Carlos Lyra, Nana Caymmi, Wimer Bottura, Toquinho, Gilda Mattoso e Christina Gurjão (as duas últimas ex-esposas do poeta) e uma carta-testamento de próprio punho.

Vinícius carregava a alma boa debaixo do braço. Era um retrato, óleo sobre madeira, pintado por Portinari e que entrava e saía das casas das esposas que passavam a ser ex-esposas, como num pacto de fidelidade a ele mesmo e ao sentimento original de estar apaixonado, não o de amor morno, mas aquele enlouquecido dos tais dezesseis ou dezessete anos. "Vire essa folha do livro e se esqueça de mim.../ Finja que o amor acabou e se esqueça de mim..." Dizia-se que saía dos relacionamentos amorosos com a escova-de-dentes, o pijama e o Portinari.

Foi jornalista, censor do DIP, secretário da embaixada brasileira em Paris. Jorginho Guinle o acompanhava nas visitas aos estúdios da Metro para assistirem às filmagens: "Vinícius era muito bem cotado, não pela importância da posição dele, mas por ele mesmo". Compartilhavam com Orson Welles a mesma adoração pelo cinema e o jazz e frequentavam o café society com Marlene Dietrich e Heddy Lammar, num lugar em que ninguém sabia onde era o Brasil e confundiam-no com a Argentina.

Detestava os aborrecimentos com direitos autorais. Era autor ou co-autor de mais de quatrocentas músicas e sabia o que isso representava. "Garota de Ipanema" havia sido gravada por Sinatra, Ella Fitzgerald e em todas as versões possíveis. Mesmo assim, Vinícius não morreu rico, sentia uma "imensa preguiça só em pensar" em contratar um advogado. Das frustrações que teve uma foi sua loucura por encontrar um despacho em que Costa e Silva dizia para Magalhães Pinto: "Afasta esse vagabundo". Garantia que se o achasse colocaria num quadro na sala, mas nunca o encontrou. Ciumento tanto das mulheres quanto dos parceiros, uma vez acordou muito zangado com Toquinho, que estava morando por uns tempos na mesma casa com Vinícius e Gesse, respondia com monossílabos e uma carranca. Toquinho, preocupado em ter dito ou feito algo que o desagradou, perguntou o que estava acontecendo: "Vou te falar a verdade: estou muito puto com você. Eu sonhei que você tinha me traído com minha mulher. Estou pensando até agora o que é que eu faria com você". Casou nove vezes, apesar de dizer que casaria de fato somente com Sérgio Cabral – declaração que rendeu uma ilustração de Jaguar no Pasquim, com Sérgio vestido de noiva – e não se cansava de procurar o "verdadeiro amor", carregando sempre o Portinari.

"Peguem meu corpo, joguem-no ao mar, lá na Avenida Niemeyer, com dois pesos nos pés. Adoraria ser comida de peixe. (...) Mas não me enterrem, pelo amor que vocês têm a mim". Morreu na banheira, lugar predileto onde recebia os amigos e compunha, com Toquinho segurando sua mão. Pediu para ser enterrado ao som de Pixinguinha. E que houvesse nenhuma tristeza: "fiz o que pude".

Obviedades
Uma professora de literatura brasileira certa vez me disse: "Vinícius é óbvio demais". Há uma arte na obviedade dele, em cantar a beleza, o amor, a amizade e a pátria, que somente ele domina. Cantar a pátria, tomamos por ufanismo nem um pouco inteligente, não se pode mais escrever sobre amor daquela maneira. Essa liberdade foi permitida para um poeta que se desvinculou do intelectualismo que ri do Brasil. Não é mais permitido amar o país, citamos cientistas políticos e somos engraçadinhos como Miguel Falabella no teatro, num besteirol de escritores irônicos e poesia concreta escatológica. Eu, que tenho esta alma velha incapaz de se adaptar ao pensamento jovem de hoje, desejaria alguma vez escrever que queria uma banheira e um amigo segurando minha mão na morte. Escrever que aqui é minha patriazinha e estive sofrendo de saudades dela quando estive longe. Talvez sobre a busca sem fim do amor verdadeiro da adolescência que Vinícius procurou em nove casamentos. Mas não posso, não podemos. Não soa bem, é ingênuo e o mundo nos engolirá por isso.

Aí está a outra regra: tais sentimentos e declarações só são permitidos a poetinhas óbvios.
"(...)

Vontade de beijar os olhos de minha pátria
De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias
De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
E sem meias pátria minha
Tão pobrinha!

(...)

Não te direi o nome, pátria minha
Teu nome é pátria amada, é patriazinha
Não rima com mãe gentil
Vives em mim como uma filha, que és
Uma ilha de ternura: a Ilha
Brasil, talvez.

(...)

Agora chamarei a amiga cotovia
E pedirei que peça ao rouxinol do dia
Que peça ao sabiá
Para levar-te presto este avigrama:
"Pátria minha, saudades de quem te ama..."

Outro crime sem perdão do Presidente
personal stylist de Lula deve estar em férias. Muito mais grave que a declaração que o presidente fez dia 24, de que estava ciente de corrupção em processos de privatização e calou, foi aquela camisa empapada de suor. Impeachment, por favor, para presidentes vestindo camisas empapadas de suor.
Um amigo diz-me que foi proposital, para dar uns ares de quem está trabalhando.

Clube da Terceira Idade
Não pode-se mais conversar com pessoas com menos de sessenta anos -precisam ir já, precisam desligar o telefone, estão atolados de trabalho. Rapidamente citam títulos, nomes e livros e saem correndo. Somente agora pude entender o antigo conselho "ouça os mais velhos": eles já sabem. Pacientes, olham os jovens como um menino que pisa num formigueiro e ri da agitação inútil das formigas. Pedirei o documento de identidade antes de iniciar qualquer conversa, que desta arte pessoas jovens não entendem – nem sequer sentam-se! Há duas ou três exceções que andam por aí em corpos trocados e parecem ter uns trinta anos, mas são velhos, bem velhinhos. E nós, do Clube da Terceira Idade, olhamos preguiçosos para o mundo por cima dos óculos, sem nem pensar em correr -faz mal aos joelhos.

Numa capela do interior
Casamento numa igreja do interior, era a filha mais velha de Dona Filomena. Queria casar-se antes da mais nova mas foi impedida pelo pai, que faz questão de seguir a ordem das idades, como os seus pais e seus avós fizeram. Na missa, enquanto o padre falava que a vida é sacrifício pelo outro e que seremos recompensados no reino dos céus, meu peito apertava pensando em Nietzsche. Fugimos da dor nas consolações cegas do cristianismo, nesses deuses que não dançam, tristes e sangrados. Olhava a imagem de uma santa sofrida que pisa numa cobra, e sentia medo daqueles anjos de olhos azuis sobrevoando um Cristo ressuscitado que resplandecia, "merda essa mentira toda do livre-arbítrio". Pensei sair um pouco lá fora e fugir daquele cenário de horror, mas Dona Filomena segurou meu braço: "A filha está tão feliz porque você veio", insistem em me querer bem e esses amores aprisionam-me dentro da vida, das igrejas, das casas.

Depois, na festa ela me segredou que pra essas coisas de infelicidade o único remédio é fazer uma horta.

Andrea Trompczynski ® 2011

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Andrea Trompczynski – O livro é um prazer sensorial para mim. Capas antigas, o cheiro, anotações. Meu sonho de consumo é uma primeira edição de Finnegan's Wake, com anotações, nas margens, da Lígia Fagundes Telles. Não há arte maior que a literatura. Não há arte mais intensa e nem mais difícil. É a única e verdadeira arte. Escrever. Vou em teatro, ouço música, sim. Mas até a HQ para mim está acima da música. Não adianta. No princípio era o verbo. Os homens são minha forma favorita de design. Não a humanidade, os homens. Anti-feminista convicta, acredito que as super-mulheres perdem o que há de melhor nos homens. Passei por essas fases de queimar sutiã e hoje vejo que certa estava minha avó, não se deve lutar contra a natureza. Tenho uma estranha sensação de déjà-vu quando conheço coisas novas, é sempre como se já tivesse visto. Como se nada fosse muito novo. Por ter andado por muitos lugares e vivido tantas coisas sem sair do meu quarto, agora finalmente vendo "de verdade e se mexendo" o mundo, não me deslumbro, não me fascino. Prefiro os livros. 

domingo, julho 03, 2011

A Auto-desajuda de Nietzsche

Andrea Trompczynski
Paro em frente à vitrine da livraria famosíssima em Curitiba. Livros de auto-ajuda por toda parte. Eu, em meio à uma discreta – e, às vezes, não tão discreta – depressão que dura toda a minha vida, deveria os ler, sim. Parecem, pelos títulos expostos ali, que ensinariam-me a vencer na vida, no amor, a aparentar sucesso profissional. Um deles até mesmo promete que descobriria O Poder dentro de mim e outros a encontrar quem mexeu no meus queijos e salames, provavelmente nomes novos para coisas espirituais. Encosto a testa no vidro, num desânimo, por saber o que todos eles dizem: que devo repetir para mim mesma, por dez minutos, todas as manhãs, que sou um sucesso. Que devo vestir-me como uma pessoa de sucesso, que devo dizer em voz alta nomes de virtudes humanas. (Oh, contava, dia desses, um amigo, que, todas as sextas-feiras, em sua empresa, uma terapeuta faz os funcionários jogarem bolas coloridas para cima, enquanto gritam nomes de virtudes humanas como: “Perseverança!”, “Coragem!”, “Fraternidade!”.) Ponho a mão no bolso para pegar mais um anti-ácido.

Decido sentar na praça, em frente à livraria famosa em que não entrei, com minha velha edição de bolso de Ecce Homo – de como a gente se torna o que a gente é, de Friedrich Nietzsche (L&PM, 2004, 206 págs.). Ele nunca estará na lista dos mais vendidos, ele nunca estará num daqueles pedestais ornados da livraria, porque Nietzsche percorre o caminho mais difícil, porque ler Nietzsche não é para qualquer um.

O mundo todo está numa corrida por virtudes humanas. Agora, ser virtuoso é bem de consumo. Antes eram os carros, a posição profissional. Depois o corpo, os músculos, o silicone, as bolsas da Daslu. Agora está na moda ser bom. Vejo as camisetas, pulseirinhas, em prol de todas as causas possíveis: guaxinins em extinção no sudoeste do Sri Lanka, criancinhas famélicas da África, o grupo de senhoras bordadeiras de São João do Triunfo... e você nem precisa conhecê-los, não, compra-se pela internet: pulseirinhas, camisetas, xícaras, imãs de geladeira da bondade humana. Acaba de passar um rapaz com meia-dúzia de pulseirinhas em prol de desabrigados, famintos e clubes de futebol falidos. Com o livro no colo, dou um meio sorriso: “a piedade é uma virtude apenas para os décadents”.

(Ah, Friedrich, por você, muitas vezes, enlouqueço, percorrendo a casa de pijamas, tateando as paredes às cegas e resmungando: "Friedrich, Friedrich, por que você morreu? Quem mais dirá tão verdadeiras coisas, meu querido?").

E calem-se nossos conceitos de Bem e Mal, para compreender Nietzsche, cale-se tudo o que se tenha aprendido. O rapaz das pulseirinhas não sabia, e, nem a moça que passa agora, com uma camiseta do Greenpeace e bolsa da campanha do "Sim" à proibição do comércio de armas, que pensava ele ser a piedade, seja com as baleias ou os times de futebol, muito parecida com as más maneiras, e, que aquela poderia interferir no destino da criatura de maneira trágica. Tiramos dela o sofrimento, tiramos dela o privilégio de crescer, e ela não se torna o que poderia ser.

Manipular pessoas com sorrisos e bajulações, galgar postos às custas do Poder dentro de Nós, e outras fórmulas que os livros de auto-ajuda ensinam, Nietzsche, há mais de cem anos, já havia desmascarado: “A condição de existência dos bons é a mentira”. Por não quererem ver, a todo custo, como a realidade é constituída no fundo. A realidade e seus horrores são mais necessários que a bondade, por ser esta de caráter mentiroso. Desvio os olhos do livro, já sorrindo completamente. Ler Nietzsche não é para qualquer um.

Uma senhora sai da livraria, felicíssima, com seu livro de auto-ajuda. Que lhe dirá mentiras horrendas sobre a alegria do otimismo. Fará a velhinha feliz, por, talvez, meia-hora. Diria Nietzsche: “o otimista é tão décadent quanto o pessimista, e talvez mais daninho do que ele".

Fico a observar a vitrine. Aquelas pilhas e pilhas de papel, todos aqueles livros, listas de mais-vendidos, em vão. Noites de autógrafos, fãs desesperadas em busca de autógrafos dos autores, que viraram celebridades. Friedrich Nietzsche havia dito que, numa frase, poderia escrever muito mais do que muitos em livros inteiros, e escreveu-as. E valem, valem mais do que todos aqueles livros. Ah, para todos os problemas da humanidade, a solução era tão simples: “No fato de um homem bem-educado fazer bem aos nossos sentidos: no fato de ele ser talhado em uma madeira que é dura, suave e cheirosa ao mesmo tempo. A ele só faz gosto o que lhe é salutar; seu prazer acaba onde as fronteiras do salutar passam a estar em perigo. O que não acaba com ele, fortalece-o. Acumula por instinto tudo aquilo o que vê, ouve e experimenta: é um princípio selecionador, ele reprova muito. Ele está sempre em sua própria companhia, honra pelo ato de selecionar, pelo ato de permitir, pelo ato de confiar. A todo tipo de estímulo ele reage lentamente, com aquela lentidão que uma longa cautela e um orgulho desejado inculcaram nele. Não acredita nem no infortúnio, nem na culpa: ele dá conta de si mesmo, ele sabe esquecer. Ele é forte o suficiente a ponto de fazer com que tudo tenha de vir para o seu bem... Vá lá, eu sou o antípoda de um décadent: pois acabei de descrever a mim mesmo.”

Deixo a praça. Não comprei nenhum livro, nenhuma pulseirinha, nenhuma camiseta. Eu precisaria mesmo era comprar um novo exemplar de Ecce Homo, que o meu, por tanto manuseio e anotações nas margens, está se desmanchando. Mas, meu livro de auto-desajuda, naquela livraria, certamente, não iria ter.

Andrea Trompczynski ® 2011
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Andrea Trompczynski – O livro é um prazer sensorial para mim. Capas antigas, o cheiro, anotações. Meu sonho de consumo é uma primeira edição de Finnegan's Wake, com anotações, nas margens, da Lígia Fagundes Telles. Não há arte maior que a literatura. Não há arte mais intensa e nem mais difícil. É a única e verdadeira arte. Escrever. Vou em teatro, ouço música, sim. Mas até a HQ para mim está acima da música. Não adianta. No princípio era o verbo. Os homens são minha forma favorita de design. Não a humanidade, os homens. Anti-feminista convicta, acredito que as super-mulheres perdem o que há de melhor nos homens. Passei por essas fases de queimar sutiã e hoje vejo que certa estava minha avó, não se deve lutar contra a natureza. Tenho uma estranha sensação de déjà-vu quando conheço coisas novas, é sempre como se já tivesse visto. Como se nada fosse muito novo. Por ter andado por muitos lugares e vivido tantas coisas sem sair do meu quarto, agora finalmente vendo "de verdade e se mexendo" o mundo, não me deslumbro, não me fascino. Prefiro os livros.


NIETZSCHE, Friedrich - Ecce Homo2.pdf
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sexta-feira, julho 01, 2011

Bundas brasileiras

Por Celso Athayde  Opinião yahoo
Ontem, no jantar, vi umas bundinhas na TV. Sim, eu comia um PF (prato feito) com dois amigos e um deles me mostrou uma cena da chamada preferência nacional. Era um programa voltado pro público feminino e a apresentadora entrevistava um empresário japonês que veio fazer divulgação de algo sobre tecnologia.
Enquanto eles falavam, umas moças dançavam, mesmo sem música, tipo no Pânico. Daí a apresentadora perguntou: “E o senhor já conheceu uma de nossas mulheres?” Antes mesmo de ele responder, ela continuou: “O que achou? Nossas mulheres são as melhores e mais lindas do mundo, né?!”
Evidentemente que eu já tinha escutado essa pergunta milhões de vezes, nos mais variados programas de televisão. Mas não sei porque, ontem não bateu bem. A impressão que dava é que ela perguntava se ele já havia experimentado um churrasquinho, ou seja, um produto nosso de exportação ou de sedução.
O senhor oriental, após a tradução, olhou para a apresentadora sorridente e para as bundas das dançarinas e deu aquele típico sorriso meio oculto e meio desavergonhado de quem já tinha, sim, experimentado uma brasileira num dia de folga!
Nem sei se deveria, mas me senti mal e ficava nítido que certas perguntas estão vestidas de um conceito anômalo, mesmo que sem intenção. Perguntar ao velho o que ele achou era ratificar um olhar que existe sobre nossas mulheres que, independentemente de serem sensuais e tropicalmente lindas, não precisam ser lembradas como algo vulgar pela mídia, a verdadeira valorização do conceito “bom, bonito e barato”.
Claro, podemos dizer que a realidade feminina hoje é melhor do que há cinquenta, cem anos, mas temos que ter cuidado para que aqueles que deveriam ajudar a diminuir a pressão sobre o país, considerado o paraíso da exploração sexual e do tráfico de mulheres, não confirmem a idéia de que “dançarina” seja a única profissão das brasileiras.
Nada contra a profissão, mas devemos concordar que essa não é uma característica tão marcante. É algo que está apenas no imaginário. Essa “cultura” está tão concentrada que até os vídeos de agências de turismo tiram sarro e claro, agridem a imagem da mulher brasileira, como este aqui:





Também achei um programa americano famoso, que falava que o Brasil está deixando de ser o país do carnaval, bunda e futebol, para ser o país das riquezas naturais e boom econômico. Inclusive, o cara da TV americana falou que às vezes tem a impressão de conhecer melhor o Brasil do que alguns brasileiros que ainda não viram a potência econômica que é o nosso país, pois ainda focam apenas nas bundas.
E o pior é que o gringo não deixa de ter razão. Nós gostamos de vender as nossas bundas. E quem vende não pode reclamar do comprador. Se abriu o bar, vai ter que aturar o bêbado. Mas será que alguém se importa com isso?
Abaixo, o vídeo do programa:






São João na Roça

Olha Pro Céu

Luíz Gonzaga

Composição: Luiz Gonzaga / José Fernandes
Olha pro céu, meu amor
Vê como ele está lindo
Olha praquele balão multicor
Como no céu vai sumindo
Foi numa noite, igual a esta
Que tu me deste o teu coração
O céu estava, assim em festa
Pois era noite de São João
Havia balões no ar
Xóte, baião no salão
E no terreiro
O teu olhar, que incendiou
Meu coração.