sexta-feira, abril 19, 2024

PEDRO LYRA: A POESIA DA GERAÇÃO 60


A Antologia organizada por Pedro Lyra, intitulada “Sincretismo: a poesia da Geração 60”, ergue-se como um farol na paisagem intelectual brasileira, iluminando os caminhos da produção poética emergida na fervilhante década de 60. Num gesto magistral, Lyra nos conduz por um labirinto de versos e vozes, revelando as sinergias e dissonâncias que caracterizaram esse período de efervescência cultural e transformação política.

 

Lyra insere sua seleção dentro do contexto histórico preciso da década de 60, destacando não apenas a agitação social e política, mas também a eflorescência de novas sensibilidades estéticas que atravessaram a atmosfera intelectual do Brasil da época. A “Geração-60” emerge assim, não apenas como um fenômeno literário, mas como um caleidoscópio de experiências humanas e expressões artísticas.

 

Uma das contribuições mais significativas de Lyra é sua refutação à tendência simplista de subestimar a produção poética da Geração 60, rotulando-a como um “vazio cultural”. Ao contrário, o autor  mostra, com eloquência, que a aparente simplicidade e falta de grandiosidade na obra dessa geração são, na verdade, manifestações de uma busca por uma arte mais comunicativa, imediata e despojada de pretensões excessivas.

 

Entretanto, Lyra não se contenta em simplesmente reabilitar o legado poético da Geração 60; ele se aventura por territórios igualmente ambiciosos, desvendando os pressupostos conceituais subjacentes ao próprio conceito de geração. Inspirado por teóricos como Karl Mannheim, Ortega y Gasset, Marías e Attias-Donfut, Lyra propõe uma tipologia complexa que busca dar conta da diversidade e complexidade do movimento poético da época.

 

Essa tipologia, que identifica três segmentos geracionais ou correntes  a tradição discursiva, o semioticismo vanguardista e a variante alternativa, também conhecida como poesia marginal , revela a riqueza e a heterogeneidade do panorama poético brasileiro dos anos 60. Esta é uma geração marcada não apenas pela pluralidade de estilos e tendências, mas também pela sua inserção nacional e diversidade de influências.

 

A seleção de Lyra oferece uma visão penetrante da “fisionomia compósita” da Geração 60, ressaltando o sincretismo de estilos e tendências que caracterizam sua produção poética. Esta é uma geração que absorve e reinterpreta influências diversas  das vanguardas dos anos 50 e 70 aos mestres consagrados como Drummond e João Cabral de Melo Neto  num processo constante de metamorfose e reinvenção.

 

A antologia elaborada por Lyra é um testemunho eloquente dessa vitalidade criativa, abrangendo uma ampla gama de poetas e correntes poéticas. A inclusão de vozes femininas, experiências épicas e reflexões metapoemáticas enriquece nossa compreensão da diversidade poética da época, desafiando as narrativas simplistas que tentam encapsular esse período.

 

No entanto, mesmo diante da magnitude e relevância da Antologia de Lyra, não podemos ignorar algumas críticas pertinentes, como a falta de uma discussão mais aprofundada sobre as características distintivas da Geração 60 e a ausência de espaço explícito para outras vertentes poéticas que também floresceram na mesma época.

 

A antologia de Pedro Lyra representa um marco da poesia brasileira, um importante esforço para resgatar e valorizar uma época de intensa criatividade. Sua Antologia desafia tanto o público quanto a crítica a reconsiderarem a importância desse período na história da literatura brasileira, convidando-nos a mergulhar nas profundezas desse oceano poético e descobrir suas infinitas possibilidades.

 

LYRA, Pedro. Sincretismo: a poesia da Geração 60: introdução e antologia. Rio de Janeiro: Topbooks, 1995. 632 p.

 

 

VICENTE FREITAS

 

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