segunda-feira, março 03, 2025

 

AINDA ESTOU AQUI?

O cinema sempre desempenhou um papel fundamental na formação de percepções políticas e sociais. Mais do que uma ferramenta de entretenimento, ele é um meio de manipulação da narrativa, capaz de direcionar emoções, valores e crenças de maneira sutil e, muitas vezes, imperceptível para o espectador. Ao contar histórias, um filme pode exaltar ou demonizar determinados eventos históricos, criando uma sensação de justiça ou injustiça, heróis ou vilões, dependendo de como os fatos são apresentados.

 

A história do cinema está repleta de exemplos de como a sétima arte foi usada para influenciar massas. Filmes como O Nascimento de uma Nação (1915) e O Triunfo da Vontade (1935) foram utilizados para consolidar discursos políticos. Hoje, a estratégia é mais sutil, mas não menos eficaz. A construção da narrativa cinematográfica atual segue um padrão: cria-se um enredo emotivo, uma mensagem de aparente justiça social e, muitas vezes, uma revisão histórica que serve a determinados interesses ideológicos.

 

Não é coincidência que um filme sobre ditadura receba um Oscar em um momento em que a própria democracia enfrenta ameaças. O timing dessas premiações sempre levanta questões sobre a intencionalidade política por trás delas. A história do próprio Oscar demonstra que a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas frequentemente utiliza a premiação como uma ferramenta de alinhamento ideológico.

 

O fenômeno mais paradoxal é a celebração do filme pela esquerda política, ao mesmo tempo em que esta mesma corrente apoia regimes autoritários ao redor do mundo. A incoerência é evidente: enquanto se denuncia a repressão do passado, há uma condescendência preocupante com ditaduras contemporâneas, desde Cuba e Venezuela até China e Coreia do Norte. Isso levanta uma questão crítica: o combate à ditadura é uma posição príncipe da esquerda ou apenas uma ferramenta retórica para deslegitimar adversários políticos?

 

Seria o espectador alienado ao não perceber essa manipulação narrativa? Essa é uma questão central. A alienação ocorre quando se aceita passivamente a mensagem sem questionamento crítico, permitindo que o discurso ideológico infiltre-se na consciência coletiva como uma verdade inquestionável. Esse fenômeno é amplificado pela atual cultura de polarização, na qual a narrativa política se impõe pela repetição massiva de discursos e imagens.

 

A esquerda contemporânea, ao celebrar determinadas produções cinematográficas, parece ignorar o fato de que seus princípios de justiça e democracia entram em contradição quando apoia regimes autoritários. A história mostra que todas as correntes políticas são suscetíveis a utilizar a cultura como instrumento de legitimação ideológica. O desafio do espectador crítico é, portanto, desconstruir essa narrativa e questionar as reais intenções por trás da produção cinematográfica.

 

O cinema é uma poderosa ferramenta de construção de realidades. A forma como eventos históricos são retratados tem um impacto direto na percepção política do público. Quando um filme sobre ditadura é celebrado em um período de ascensão autoritária, é necessário um olhar mais profundo para compreender quais interesses estão sendo atendidos. A análise crítica é essencial para evitar ser manipulado por narrativas que podem estar moldando o pensamento político de maneira imperceptível.


Um filme que condena a ditadura é comemorado por esquerdistas que apoiam outras ditaduras e gritam “sem anistia”. Quem já viu tamanha alienação?

 

Vicente Freitas Liot

 

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