O Grito do Ipiranga - Pedro Américo l |
D.
Pedro II foi educado pelos melhores professores brasileiros e era estimulado
por seu tutor, José Bonifácio de Andrada e Silva, a travar contato com as artes
e os artistas de seu tempo. A isto somado o fato da força do cultivo do café na
lavoura brasileira, o Segundo Reinado no Brasil foi bastante próspero e trouxe
muitos avanços em arte e cultura. D.
Pedro II foi o maior incentivador da cultura e da arte na história do Brasil.
Pedro Américo, subvencionado pelo Império, estudou na Europa e, a pedido do
Imperador, pintou várias obras. Destaque para “O Grito do Ipiranga”, de 1888.
O
fato de o quadro datar de 66 anos após os eventos protagonizados pelo pai do
Imperador, D. Pedro I, não deve toldar o nosso raciocínio.
Antecedentes
A
Independência foi fermentada num longo processo. Napoleão Bonaparte liderava a
Revolução Burguesa na Europa, num tempo em que Portugal era refém econômico da
grande potência da época, a Inglaterra. Com o avanço inexorável de tropas napoleônicas
a Portugal, a Inglaterra enviou tropas e navios, tanto para combater Napoleão
quanto para escoltar a Família Real para o Brasil em 1808.
Muitos historiadores enfatizam o momento da transferência da Família real para
o Brasil como o marco do início de todo o processo de Independência em relação
a Portugal. Alguns preferem a expressão “emancipação política”, dada a
dependência crônica em relação ao grande capital estrangeiro. Naquela época,
Inglaterra. Hoje, EUA.
No Brasil D. João VI começa a esboçar o
arcabouço de uma Nação Soberana, com um Banco próprio, o Banco do Brasil,
fundado no momento de sua chegada, 1808, a assinatura de Tratados de Comércio
com as Nações Amigas, etc. No Congresso de Viena, em 1815, ocorre a Elevação do
Brasil a Reino Unido a Portugal e Algarves, com o rei D. João VI residindo
aqui. O Brasil, formalmente, não era mais uma Colônia, mas um Reino Unido. Em
torno deste tema gira todo o processo de Independência em relação a Portugal.
As
cortes, comandadas pela burguesia portuguesa, eram compostas por homens levados
ao poder no processo conhecido como Revolução do Porto: afirmavam a autonomia
política de Portugal em relação à Inglaterra mas desejavam avidamente levar
novamente o Brasil ao estatuto de Colônia.
O movimento de ruptura com as cortes em
Portugal já estava fermentando na mente de D. João VI quando foi forçado a
voltar para lá em 1821 após a deposição dos ingleses pelas cortes de Lisboa na
Revolução do Porto. Percebendo os ânimos daqueles que começavam a orgulhar-se
em chamar-se de BRASILEIROS deixou D. Pedro como Príncipe Regente e recomendou:
“Pedro, se o Brasil se separar, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do
que para algum desses aventureiros”.
José Bonifácio de Andrada e Silva
Em dezembro de 1821 chega ao Rio de
Janeiro uma ordem das cortes a D. Pedro. Deveria ele abolir a regência e
regressar imediatamente a Portugal. Resignado, começa a fazer os preparativos
para o regresso quando a onda de indignação dos brasileiros se faz notória.
José Bonifácio de Andrada e Silva, na condição de membro destacado do governo
provisório de São Paulo, envia uma carta a D. Pedro. Nela criticava duramente a
decisão das Cortes de Lisboa e chamava a sua atenção para o importante papel
reservado ao príncipe nesse momento de crise. Aquela carta foi publicada na
Gazeta do Rio de 8 de janeiro de 1822, com grande repercussão. Dez dias depois,
chegou ao Rio uma comitiva paulista, integrada por José Bonifácio, para
entregar ao príncipe a representação paulista. Nesse mesmo dia, D. Pedro nomeou
José Bonifácio ministro do Reino e dos Estrangeiros, cargo que este resolveu
aceitar depois da insistência do próprio príncipe. Essa nomeação tinha um forte
significado simbólico: pela primeira vez o cargo era ocupado por um brasileiro.
Empossado no cargo de ministro do Reino
e de Estrangeiros, em janeiro de 1822, Bonifácio logo conquistou, para a causa
emancipadora, os representantes da Áustria e da Inglaterra. Além disso, ordenou
ao Chanceler-Mor (cargo que corresponde, hoje, ao de ministro da Justiça) que
não publicasse lei alguma, vinda de Portugal, sem primeiro submetê-la à a
apreciação do príncipe; nomeou um cônsul brasileiro para Londres, declarando,
ao Gabinete inglês, que só tal funcionário poderia, então, liberar navios que
se destinassem ao Brasil; enviou emissários às Províncias do norte, a fim de
congregá-los para a causa da independência, avisando que teriam que se sujeitar
à regência de D. Pedro e não às ordens que recebessem de Lisboa.
As Províncias do norte estavam ao lado das Cortes
portuguesas e executando o decreto 124, de 29 de setembro de 1821;
principalmente, no Maranhão, o que fez com que José Bonifácio, em ofício à
Junta de Governo daquela Província, dissesse, ironicamente, que não era de se esperar
que o Maranhão tivesse "a aparente e fastigiosa idéia de ser considerada
província daquele reino (Portugal)". O Brasil, àquela altura dos
acontecimentos, não podia continuar fragmentado e José Bonifácio estava
enfrentando a tarefa hercúlea de reunir as Províncias, unindo o país em torno
de uma idéia política, que era a monarquia constitucional parlamentar. No dizer
de Tito Lívio Ferreira e Manoel Rodrigues Ferreira, “sob esse ponto de vista,
ele é, legitimamente, o campeão da unidade do Brasil”.
Sempre ativo, aliciou conspiradores em Pernambuco, no
Maranhão, no Rio Grande do Norte, na Bahia e no Pará, para que se rebelassem,
na hora exata, contra a metrópole que o ludibriara, traindo o acordo do Reino
Unido de Portugal e do Brasil; em junho de 1822, reorganizou o erário, por
intermédio de seu irmão, Martim Francisco, e, em julho, formou uma nova Armada,
contratando, para a obra de construção da Marinha de Guerra, o marujo e
aventureiro lorde Cochrane. Importante ainda a presença de Gonçalves Ledo, que
angariou os fundos necessários para fortalecer a Armada.
Levou D. Pedro a conquistar a simpatia das populações
de Minas e de São Paulo, forçando-o a viajar, pois, dizia ele, “o Brasil não é
o Rio de Janeiro”. Quando os decretos vindos de Portugal anulavam,
sumariamente, todos os atos da regência, ele, habilmente aliado a D.
Leopoldina, escreve a D. Pedro, jurando que, de Portugal, o humilham: “De
Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores. Venha V.A. Real o
quanto antes e decida-se; porque irresoluções e medidas de água morna, à vista
desse inimigo que não nos poupa, para nada servem – e um momento perdido é uma
desgraça”. Com isso, instigava o príncipe a se rebelar, combatendo as suas
hesitações e desânimos.
Hoje estão disponíveis – inclusive na
Internet – os documentos comprobatórios de que os acontecimentos de 7 de
setembro foram premeditados e conduzidos por José Bonifácio.
O 7 de Setembro em documentos
Em fins
de agosto, a Maçonaria no Brasil se organizava e enviava emissários como
Antônio de Menezes Vasconcellos Drummond que, chegando de Pernambuco para onde
fora comissionado por José Bonifácio, traz informações e cartas inquietantes.
As Cortes em Lisboa chamando o Príncipe de “rapazinho”, ordenam seu imediato
regresso e ainda o aprisionamento de Bonifácio.
Encontra-se no magistério muitos professores que preferem minimizar (ou mesmo
ridicularizar) os fatos que tiveram lugar às margens do Ipiranga naquela data.
Não me conto entre estes. Quem dera os governantes de hoje tivessem a mesma
coragem!
A documentação comprobatória é muito
extensa e está à disposição do pesquisador. À falta de maiores habilidades ou
mesmo confiança no método chamado de “viagens astrais”, atenho-me à documentação.
Cito aqui, a título de exemplo, a carta do Padre Belchior, de 1896, mencionada
por José Castellani em sua página e que diz, em seus pontos principais, o
seguinte:
“O príncipe mandou-me ler alto as cartas trazidas por Paulo
Bregaro e Antônio Cordeiro. (...) D. Pedro, tremendo de raiva, arrancou de
minhas mãos os papéis e, amarrotando-os, pisou-os e deixou-os na relva. Eu os
apanhei e guardei. Depois, abotoando-se e compondo a fardeta – pois vinha de
quebrar o corpo à margem do riacho do Ipiranga, agoniado por uma disenteria,
com dores, que apanhara em Santos – virou-se para mim e disse:
– E agora, padre Belchior?
E eu respondi prontamente:
– Se V.A. não se faz rei do Brasil, será prisioneiro
das Cortes e talvez deserdado por elas. Não há outro caminho, senão a
independência e a separação.
D. Pedro caminhou alguns passos, silenciosamente,
acompanhado por mim, Cordeiro, Bregaro, Carlota e outros, em direção aos nossos
animais, que se achavam à beira da estrada. De repente estacou-se, já no meio
da estrada, dizendo-me:
– Padre Belchior, eles o querem, terão a sua conta.
As Cortes me perseguem, chamam-me, com desprezo, de rapazinho e brasileiro.
Pois verão agora o quanto vale o rapazinho. De hoje em diante estão quebradas
as nossas relações: nada mais quero do governo português e proclamo o Brasil
para sempre separado de Portugal!
(...) E arrancando do chapéu o laço azul e branco,
decretado pelas Cortes, como símbolo na nação portuguesa, atirou-o ao chão,
dizendo:
_ Laço fora, soldados! Viva a independência, a
liberdade, a separação do Brasil.
(...) O príncipe desembainhou a espada, no que foi
acompanhado pelos militares; os paisanos tiraram os chapéus. E D. Pedro disse:
_ Pelo meu sangue, pela minha honra, pelo meu Deus,
juro fazer a liberdade do Brasil.
(...) Firmou-se nos arreios, esporeou sua bela besta
baia e galopou, seguido de seu séquito, em direção a São Paulo, onde foi
hospedado pelo brigadeiro Jordão, capitão Antônio da Silva Prado e outros, que
fizeram milagres para contentar o príncipe.
Mal apeara da besta, D. Pedro ordenou ao seu ajudante
de ordens que fosse às pressas ao ourives Lessa e mandasse fazer um dístico em
ouro, com as palavras “Independência ou Morte”, para ser colocado no braço, por
um laço de fita verde e amarela. E com ele apareceu no espetáculo, onde foi
chamado o rei do Brasil, pelo meu querido amigo alferes Aquino e pelo padre
Ildefonso (...)”
D. Pedro e a Maçonaria
A ata da nona sessão do Grande Oriente
do Brasil – Assembléia Geral – realizada no 13º dia do 5º mês maçônico do Ano
da Verdadeira Luz 5822 (2 de agosto de 1822), consta ter o Grão-Mestre da
Ordem, conselheiro José Bonifácio de Andrada e Silva, proposto a iniciação de
Sua Alteza D. Pedro de Alcântara. E que, “aceita a proposta com unânime
aplauso, e aprovada por aclamação geral, foi imediata e convenientemente
comunicada ao mesmo proposto, que se dignando aceitá-la, compareceu logo na
mesma sessão e sendo também logo iniciado no primeiro grau na forma regular e
prescrita na liturgia, prestou o juramento da Ordem e adotou o nome heróico de
Guatimozin”. Na décima sessão, realizada a 5 de agosto, Guatimozin recebeu o
grau de Mestre Maçom.
A ata da 14ª sessão – Assembléia Geral
– do Grande Oriente Brasílico, fundado a 17 de junho de 1822, fechado a 25 de
outubro do mesmo ano, pelo seu Grão-Mestre, D. Pedro I, e reinstalado como
Grande Oriente do Brasil, em 1831, foi publicada, junto com outras, no Boletim
Oficial do Grande Oriente do Brasil, Nº 10, de outubro de 1874, no Ano III da
publicação (criada em 1872).
Daquela ata, consta que a Assembléia
decidiu ser imperiosa a proclamação da independência e da realeza
constitucional, na pessoa de D. Pedro. Mostra, também, que o dia da sessão, 20º
dia do 6º mês maçônico do Ano da Verdadeira Luz de 5822, era o dia 9 de setembro.
Isso porque o Grande Oriente utilizava, na época, um calendário equinocial,
muito próximo do calendário hebraico, situando o início do ano maçônico no dia
21 de março (equinócio de outono, no hemisfério Sul) e acrescentando 4000 aos
anos da Era Vulgar. Desta maneira, o 6º mês maçônico tinha início a 21 de
agosto e o seu 20º dia era, portanto, 9 de setembro, como situa o Boletim de
1874.
Portanto, não é procedente supor que a
data da Assembléia tenha sido 20 de agosto (dia do Maçom no Brasil), tampouco
se deve minimizar o fato de que a Maçonaria atuava viva e ativamente na direção
da independência, particularmente através do Grão Mestre José Bonifácio e do
Primeiro Vigilante, Ledo Ivo.
O fato existiu – temos a ata – e é
digno de ser lembrado e comemorado por todos os maçons, mesmo porque não era
possível, no dia 9, os obreiros terem conhecimento dos fatos do dia 7, dados os
escassos recursos de comunicação da época. Mas não a ponto de falsear a verdade
histórica, quer por ufanismo, quer por desconhecimento.
Para saber mais: Curso de História do
Brasil da página Cultura Brasileira:
Lázaro Curvêlo Chaves
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