terça-feira, agosto 30, 2011

Acidente com estudantes da UVA deixa dois mortos e vários feridos

Acidente com um ônibus escolar e um caminhão ocorreu na estrada que liga Sobral a Santana do Acaraú. Duas pessoas morreram e outras 33 ficaram feridas. O desastre ocorreu no começo da noite de ontem na rodovia estadual CE-178, que liga as cidades de Santana do Acaraú e Sobral, na Zona Norte do Estado (a 230Km de Fortaleza). O coletivo transportava cerca de 40 estudantes universitários residentes em Acaraú que iam assistir aula na Universidade Vale do Acaraú (UVA), em Sobral.


Conforme informações do comandante do 3º Batalhão da Polícia Militar (Sobral), tenente-coronel PM Gilvandro Oliveira, o desastre teria sido provavelmente ocasionado pelo motorista do coletivo, que tentou uma ultrapassagem arriscada em local proibido e num trecho de curva da CE-178, próximo à subestação de energia elétrica, na localidade de Mato Grosso a dez quilômetros de Sobral.
Uma moto
Conforme o oficial, o motorista do coletivo relatou que, ao tentar ultrapassar um caminhão-baú, percebeu que uma motocicleta vinha em sentido contrário e não teve tempo de ultrapassar o caminhão para voltar à sua mão de direção.
"Ele então tentou retornar para a pista correta, mas o ônibus bateu na lateral do caminhão-baú e os dois tombaram lateralmente. O caminhão foi jogado fora da estrada", disse à Reportagem o coronel Gilvandro.
Com o impacto, os 40 passageiros do coletivo ficaram feridos. Quatro alunos foram para debaixo dos destroços do ônibus e dois morreram na hora. Outros dois foram retirados do local pelo Corpo de Bombeiros com a ajuda de policiais militares do 3º BPM e da Polícia Rodoviária Estadual (PRE).
No fim da noite, os mortos foram identificados no Instituto Médico Legal (IML) de Sobral. Eram as estudantes Maria Vanessa Gomes, que cursava Letras na UVA; e Silvana Pereira Rufino, 18, do curso de Filosofia. Ambas moravam na cidade de Acaraú (litoral oeste).
Ferragens
Outras duas jovens que também ficaram sob as ferragens do ônibus foram resgatadas do local em estado grave. Veja fotos do acidente AQUI

RELAÇAO DOS UNIVERSITARIOS QUE DERAM ENTRADA NO HOSPITAL SANTA CASA.
ARTEMISIA PEREIRA DA SILVA 27 04 85 ACARAU
JOSE ELEOINIR DA SILVA 26 02 87 JURITIANA ACARAU
CLOVES RIBEIRO RODRIGUES 07 07 83 ACARAU
ANDERSON LILVINO SANTOS 01 01 88 CE NTRO ACARAU
JOSE HUMBERTO MAIA 15 12 75 ACARAU
FRANCISOC GLEISON DE SOUSA 14 10 91 ACARAU
JOSADARC DE SOUSA FERREIRA 20 01 91 ACARAU
ANA CAROLINA RODRIUGES 11 09 89 ZONA RURAL ACARAU
FRANCISCO ALAN SOUSA 18 06 93 ZONA RURAL BELA CRUZ
FRANCISCO NISLTON PESSOA 04 05 89 ACARAU
VAGNER ANDERSON DO NASCIMENTO 14 08 90 ACARAU
SEBASTIÃO RIBEIRO RUFINPO 20 01 88 ACARAU
MARCIA MARIA ARAUJO FONTELES 25 01 92 ACARAU
FRANCISCO DELOMAR 27 10 91 ACARAU
PATRIA VALERIA OLIVEIRA DA SILVA 29 11 91 ACARAU
DANIELE ADAO DE SOUSA 10 01 93 ACARAU
BRENA RIBEIRO ALVES 26 06 94 ACARAU
FRANCISCO DANIEL DE FREITAS GALVAO 05 08 93 ACARAU
ARIEL MONTEIRO DE VASCONCESCELOS 278 07 90 ACARAU
ANA CRISTINA DE SOUSA CARNEIRO 15 10 89 ACARAU
MARIA ELIEZE NUNES DA SILVA 10 06 92 ACARAU
FRANCISCO ARUTRU VASCONCELOS DE SOUSA 31 03 87
MARIA JAQUELINE ARAUJO 28 03 93 ACARAU
FRANCISCO TIAGO DO NASCIMENTO 16 07 90 ACARAU
GEOVANA GEOVA SILVEIRA SILVA 03 12 78 ACARAU
MARIA VANABIA ALVES 23 11 92 ACARAU
PAULO RODRIGUES DE SOUSA NASCIMENTO 20 10 91 ACARAU
FRANCISCO RAFAELE FERREIRA 17 01 81 ACARAU
MOTORISTA DO ONIBUS: FRANCISCO MANFREDO DE LIMA, ELE NADA SOFREU.
MOTORISTA DO CAMINHÃO: FRANCISCO WELLINGTON DE OLIVEIRA BEZERRA/ TAMBÉM NADA SOFREU.











Fotos: Sobral Portal de Notícias; informações: Diário do Nordeste 

segunda-feira, agosto 29, 2011

O Poder do Amor


  Por que não ser o mar,
elevar as ondas mais belas
     e o Senhor louvar?

  Por que não ser o vento,
 correr de porta em porta
     levar paz e alento?

   Por que não ser o sol,
     aquecer os corações
   nas chamas do arrebol?

    Por que não ser o ar,
       varrer a poluição
       num jato sem par?

   Por que não ser a terra,
      servir à humanidade
com os tesouros que encerra?

   Por que não ser um raio,
   destruir armas nucleares,
guardar o mundo de desmaio?

  Por que não ser o fogo,
 incinerar drogas nocivas
   nas escolas, nos lares
 nos presídios e nos bares
em cada esquina, sem véus
destruindo criança e adulto
carentes do espírito de Deus?
           
             Porque

 Mesmo não sendo o mar
      O vento, o sol, o ar
    o raio, o fogo, a terra
           Se o meu ser
O carisma de DEUS descerra
      Posso com AMOR
        Tudo MUDAR.

               
Maria de Jesus A. Carvalho

domingo, agosto 28, 2011

Sete pontos acerca da Líbia

Doravante mesmo os cegos podem ver e compreender o que está a acontecer na Líbia:
por Domenico Losurdo


1. O que se passa é uma guerra promovida e desencadeada pela NATO. Esta verdade acaba por se revelar até mesmo nos órgãos de "informação" burgueses. No La Stampa de 25 de Agosto, Lucia Annunziata escreve: é uma guerra "inteiramente externa, ou seja, feita pelas forças da NATO"; foi "o sistema ocidental que promoveu a guerra contra Kadafi". Uma peça do International Herald Tribune de 24 de Agosto mostra-nos "rebeldes" que se regozijam, mas eles estão comodamente instalados num avião que traz o emblema da NATO.

2. Trata-se de uma guerra preparada desde há muito tempo. O Sunday Mirror de 20 de Março revelou que "três semanas" antes da resolução da ONU já estavam em acção na Líbia "centenas" de soldados britânicos, enquadrados num dos corpos militares mais refinados e mais temidos do mundo (SAS). Revelações ou admissões análogas podem ser lidas no International Herald Tribune de 31 de Março, a propósito da presença de "pequenos grupos da CIA" e de uma "ampla força ocidental a actuar na sombra", sempre "antes do desencadeamento das hostilidades a 19 de Março".

3. Esta guerra nada tem a ver com a protecção dos direitos humanos. No artigo já citado, Lucia Annunziata observa com angústia: "A NATO que alcançou a vitória não é a mesma entidade que lançou a guerra". Nesse intervalo de tempo, o Ocidente enfraqueceu-se gravemente com a crise económica; conseguirá ele manter o controle de um continente que, cada vez mais frequentemente, percebe o apelo das "nações não ocidentais" e em particular da China? Igualmente, este mesmo diário que apresenta o artigo de Annunziata, La Stampa, em 26 de Agosto publica uma manchete a toda a largura da página: "Nova Líbia, desafio Itália-França". Para aqueles que ainda não tivessem compreendido de que tipo de desafio se trata, o editorial de Paolo Paroni (Duelo finalmente de negócios) esclarece: depois do início da operação bélica, caracterizada pelo frenético activismo de Sarkozy, "compreendeu-se subitamente que a guerra contra o coronel ia transformar-se num conflito de outro tipo:   guerra económica, com um novo adversário:   a Itália obviamente".

4. Desejada por motivos abjectos, a guerra é conduzida de modo criminoso. Limito-me apenas a alguns pormenores tomados de um diário acima de qualquer suspeita. O International Herald Tribune de 26 de Agosto, num artigo de K. Fahim e R. Gladstone, relata: "Num acampamento no centro de Tripoli foram encontrados os corpos crivados de balas de mais de 30 combatente pró Kadafi. Pelo menos dois deles estavam atados com algemas de plástico e isto permite pensar que sofreram uma execução. Dentre estes mortos, cinco foram encontrados num hospital de campo; um estava numa ambulância, estendido numa maca e amarrado por um cinturão e tendo ainda uma transfusão intravenosa no braço".

5. Bárbara como todas as guerras coloniais, a guerra actual contra a Líbia demonstra como o imperialismo se torna cada vez mais bárbaro. No passado, foram inumeráveis as tentativas da CIA de assassinar Fidel Castro, mas estas tentativas eram efectuadas em segredo, com um sentimento de que se não é por vergonha é pelo menos de temer possíveis reacções da opinião pública internacional. Hoje, em contrapartida, assassinar Kadafi ou outros chefes de Estado não apreciados no Ocidente é um direito abertamente proclamado. O Corriere della Sera de 26 de Agosto de 2011 titula triunfalmente: "Caça a Kadafi e seus filhos, casa por casa". Enquanto escrevo, os Tornado britânicos, aproveitando também a colaboração e informações fornecidas pela França, são utilizados para bombardear Syrte e exterminar toda a família de Kadafi.

6. Não menos bárbara que a guerra foi a campanha de desinformação. Sem o menor sentimento de pudor, a NATO martelou sistematicamente a mentira segundo a qual suas operações guerreiras não visavam senão a protecção dos civis! E a imprensa, a "livre" imprensa ocidental? Ela, em certo momento, publicou com ostentação a "notícia" segundo a qual Kadafi enchia seus soldados de viagra de modo a que eles pudessem mais facilmente cometer violações em massa. Como esta "notícia" caiu rapidamente no ridículo, surge então uma outra "nova" segundo a qual os soldados líbios atiram sobre as crianças. Nenhuma prova é fornecida, não se encontra nenhuma referência a datas e lugares determinados, nenhuma remessa a tal ou tal fonte: o importante é criminalizar o inimigo a liquidar.

7. Mussolini no seu tempo apresentava a agressão fascista contra a Etiópia como uma campanha para libertar este país da chaga da escravidão; hoje a NATO apresenta a sua agressão contra a Líbia como uma campanha para a difusão da democracia. No seu tempo Mussolini não cessava de trovejar contra o imperador etíope Hailé Sélassié chamando-o "Negus dos negreiros"; hoje a NATO exprime seu desprezo por Kadafi chamando-o "ditador". Assim como a natureza belicista do imperialismo não muda, também as suas técnicas de manipulação revelam elementos significativos de continuidade. Para clarificar quem hoje realmente exerce a ditadura a nível planetário, ao invés de citar Marx ou Lénine quero citar Emmanuel Kant. Num texto de 1798 (O conflito das faculdades), ele escreve: "O que é um monarca absoluto? Aquele que, quando comanda: 'a guerra deve fazer-se', a guerra seguia-se efectivamente". Argumentando deste modo, Kant tomava como alvo em particular a Inglaterra do seu tempo, sem se deixar enganar pela forma "liberal" daquele país. É uma lição de que devemos tirar proveito: os "monarcas absolutos" da nossa época, os tiranos e ditadores planetários da nossa época têm assento em Washington, em Bruxelas e nas mais importantes capitais ocidentais. 

segunda-feira, agosto 22, 2011

Edital de Convocação dos Srs. Sócios do Alvorada Clube

Maria Valnice Fonteles devidamente creditada, pela maioria dos sócios e/ou seus representantes, do Alvorada Clube, na conformidade do abaixo assinado que exibe, vem autorizada convocar todo o quadro social, por si e/ou por seus representantes legalmente constituídos, do Alvorada Clube de Bela Cruz-CE., para se fazerem presentes à reunião em Assembleia Extraordinária, no dia 10 de setembro às 10:00 horas, no Centro Pastoral, sito na Rua Humaitá, a fim de deliberarem pela constituição de uma comissão provisória diretora e logo em seguida, sob a direção desta comissão aclamada, decidirem por votação e/ou aclamação da nova diretoria para gerir o Alvorada Clube, seguindo o regulamento estatutário do Clube. Fica consignado que os trabalhos acima mencionados serão abertos com a convocação e presença de dois terços (2/3) dos sócios e/ou seus representantes legalmente constituídos na primeira chamada, e, em segunda chamada, 30 (trinta) minutos depois, com a presença dos que se fizerem presentes. Na pauta será observado o seguinte:
01 – Eleição por aclamação da Comissão Provisória, para dirigir os trabalhos naquela ocasião;
02 – Eleição, em seguida, da nova diretoria, por votação ou por aclamação;
03 – Apresentação do plano de trabalho, para soerguimento do Alvorada Clube;
04 – Facultação da palavra e outras discussões que se fizerem necessárias.

Bela Cruz, 16 de agosto de 2011

Assinado: Maria Valnice Fonteles


Obs.: Se você fez parte da Associação Alvorada Clube, de Bela Cruz, e concorda com sua reestruturação, você está convidado para a reunião do dia 10 de setembro, próximo. Assine esta procuração e envie para Valnice Fonteles. FAX: (88) 3663-1648.



PROCURAÇÃO PARTICULAR

Nós, abaixo assinados e devidamente identificados como sócios do Alvorada Clube, de Bela Cruz, cujo estatuto de 6 de setembro de 1965, conforme cópia em anexo, registrada no Cartório de Imóveis de Acaraú, em 07 de julho de 1995, nomeamos a Sra. Maria Valnice Fonteles, brasileira, viúva, RG nº 711.304, CPF: 256 268 843 00, residente e domiciliada em Bela Cruz, na Rua Capitão Miguel Lopes, nº 203, nossa bastante procuradora, dando amplos poderes para promover o movimento de reestruturação da Associação Alvorada Clube, com o objetivo de resgatar suas atividades sócio-culturais, entre elas a “Festa do Caju”, representando nós sócios, abaixo identificados, inclusive com poderes de contestar e assinar documentos, enfim, tudo o que mais assinar, praticar o que for necessário ao bom e fiel cumprimento deste mandato.

Bela Cruz, 01 de dezembro de 2010


_______________________________
Assinatura:
R.G.:
CPF:

quarta-feira, agosto 17, 2011

Contos e fábulas do Brasil

No Brasil, não são muitas as coletâneas de contos populares, apesar da alardeada riqueza da nossa cultura popular e do empenho de estudiosos, como Sílvio Romero, Câmara Cascudo e Lindolfo Gomes. A publicação de Contos e fábulas do Brasil, pela editora Nova Alexandria, se reveste, por isso, de grande importância. Coligidos por Marco Haurélio, estes contos da tradição oral brasileira estão agora imortalizados em um livro que conta, também, com belíssimas ilustrações do artista plástico paraibano Severino Ramos.

A coletânea traz contos de animais, histórias de encantamento, religiosas e acumulativas. Há, ainda, notas esclarecedoras, assinadas pelo renomado pesquisador português, Paulo Correia, da Universidade do Algarve, mostrando o percurso das histórias, o número de versões existentes nos países de língua portuguesa e os similares de outros países.

Marco Haurélio, também, na abertura de cada seção, amparado em ampla pesquisa, num trabalho que dosa rigor e criatividade, aponta variantes das histórias colhidas por ele em outras coletâneas e até o reaproveitamento de muitas delas na literatura de cordel. Os leitores da obra dos Irmãos Grimm identificarão em Maria Borralheira a versão brasileira de Cinderela. E reconhecerão em O príncipe Teiú elementos da clássica história A bela e a fera e do conto mítico Eros e Psiquê, que integra O asno de ouro, escrito por Apuleio no século II d.C.

Segundo a professora Isabel Cardigos, referência mundial no estudo do conto popular, Contos e fábulas do Brasil, é “um livro fadado para ter a maior sorte: entre os adultos e entre aquelas crianças felizes a quem os adultos vão saber recontar estas histórias para que, com a ajuda da escrita, continue a correr a antiquíssima magia dos contos de tradição oral.”

Sobre o autor: Marco Haurélio, baiano de Riacho de Santana, é escritor, editor e pesquisador da cultura popular brasileira. No campo do folclore, além desteContos e fábulas do Brasil, escreveu Contos folclóricos brasileiros (Paulus). Para a coleção Clássicos em Cordel, da Nova Alexandria, adaptou A megera domada, de William Shakespeare, e O Conde de Monte Cristo, este um dos vencedores do Prêmio Mais Cultura de Literatura de Cordel – edição 2010.
Contos e fábulas do Brasil — Marco Haurélio
Ilustrações de Severino Ramos
ISBN 978-85-7492-265-2
16X23 cm — 216 págs.
Preço: R$ 38,00


Mais informações:
Janaína Gomes
imprensa@novaalexandria.com.br
2215-6252

Juliana Messias
editorial@novaalexandria.com.br
2215-6252

Blog do livro:
http://contos-fabulas.blogspot.com/

quinta-feira, agosto 04, 2011

O Pé de Juá

Maria de Jesus Carvalho
Ainda está ali. Silencioso, imenso, majestoso, arqueando ao peso dos galhos frondosos. Há quanto tempo? Não sei. Quando o conheci já era assim. Situado em meio às matas de pau-branco, veste-se de diferentes tonalidades de verde, à medida que as estações mudam, pois apesar das rudes intempéries que assolam o Ceará, continua sempre belo e acolhedor, abrigando quem chega fatigado ou quem recreia à sua sombra. Sob seus ramos há paz e tranquilidade. Dali, respirando o ar puro e saudável dos campos, pode-se contemplar o maravilhoso espetáculo do amanhecer e pôr-do-sol, quando os cômoros se banham de luz, desenhando misteriosos arabescos ao lusco-fusco e o canto dos pássaros enfeita as matas com mística orquestração. É bom de ouvir as notinhas melodiosas que vibram dos pequenos cantores, ao voltarem para seus ninhos no final da tarde. À noite, quando um punhado de estrelas brilha no céu, a velha árvore se transforma num imenso albergue para quadrúpedes que não têm onde dormir.

Em retrospecto a um tempo já bem distante, vejo-me em   companhia de alguns primos e primas, armando balanços, clareando os dentes com o pó da casca da árvore, comendo frutinhos, brincando de cirandas, aproveitando o mais que podíamos daqueles momentos de lazer, até a hora em que fôssemos chamados de volta para casa. Isso me traz doces recordações e muita saudade. Aqui, no alpendre da antiga casa de campo dos meus avós maternos, conversando com Luíza, uma prima que há muito não via, estamos a relembrar aqueles momentos agradáveis dos tempos de criança.

– Sabe, Maria, sempre que posso, venho passar uns dias aqui, descansar um pouco da vida agitada da cidade grande. A tranquilidade do interior restaura minhas forças, liberta da poluição. Respiro ar puro... – Fala, enchendo os pulmões de ar e soltando, ao mesmo tempo que movimenta os braços.

– É realmente muito gostoso, ouvir o canto dos passarinhos, ver os animais pastarem,  as aves catarem alimentos... Sem falar neste clima maravilhoso, ouvindo o cantarolar do vento nas palmas das carnaubeiras.

– Nossa! Como você é romântica, prima. Dá para ser uma poetisa!...

– Não sei se chegaria a tanto, mas tenho vontade de escrever um poema. Estou estudando metrificação e rima. Quem sabe, um dia chegue a ser uma poetisa ou escreverei um livro sobre os nossos tempos de férias em Bela Cruz... Gosta da ideia?

– Claro, Maria, como tenho boas lembranças daquele tempo!... Esteve lá, desta vez?

– Sim. Na praça principal, admirando a beleza arquitetônica da Igreja Matriz. Visitei a casa de meus avós, deteriorada pelo abandono, despertando saudades. A sua, Luíza, está bem conservada e impregnada de doces lembranças. Era gostoso armar redes nas árvores do quintal de sua casa, montar casinhas de bonecas e brincar de comadres. Às vezes, fazíamos panelada com a ajuda de sua mãe que se comprazia em participar daquela quadra inocente. Lembra? Uma vez, você preparou um almoço, cozinhando em panelinhas pequenas: arroz, carne, farofa; o feijão sua mãe fez e nos deu um pouco. Como sobremesa, tivemos rodelas de limão com açúcar... Ficou tudo uma delícia! Era muita gente pra comer, mas chegou para todos.

– Ai, prima! Falando desse jeito, me deu vontade de chorar... Qual a primeira vez que veio visitar os avós?

– Não recordo nada dessa primeira vez, porque contava apenas oito meses de idade. Viajei em uma tipóia nos braços de meu pai, a cavalo, numa bonita noite de luar, a fim de me batizar. Depois de oito anos, vim com minha família passar as férias de que falei há pouco. Por causa do inverno muito forte, as estradas dificultavam a circulação de carros e fui levada a estudar no Instituto Maria Imaculada, na 1ª série, para não me atrasar nas matérias. Meu pai só veio nos buscar quando as chuvas diminuíram.

– De todas as férias, a melhor que achei foi aquela em que dançamos a quadrilha. Lembra? Os meninos usavam cartolas e as meninas uns cachos brancos feitos de algodão. De quem foi a ideia? Nunca tinha visto roupa matuta daquele jeito.

– Ah! Naquele tempo eu estava com quatorze anos. Estávamos todos diferentes. Nosso encontro tornou-se difícil porque havíamos mudado, crescido em corpo e em mente. As brincadeiras foram substituídas pelos “flirts”, bailes, prendas, serenatas, serestas, tudo ao luar porque não havia luz elétrica. Logo que cheguei, pessoas ligadas à Igreja pediram-me para fazer um festival beneficente e resolvi ensaiar a quadrilha porque estava na época das festas juninas. Era uma quadrilha à francesa. Eu, mesma, já havia dançado daquele modo. Naquela época, já me interessava pela arte, cujos conhecimentos adquiri no Colégio das Irmãs em São Benedito. Os ensaios e confecção das roupas foram feitos na casa do meu avô. Apresentei a quadrilha com outros números de arte, no Salão Paroquial. Foi muito divertido! O público aplaudia de pé, atirava bombons e flores no palco. Ao terminar, um jovem louro tipo Marlon Brando, veio-me dar parabéns acompanhados de uma linda rosa vermelha. Disse-me que era da família Lima de Bela Cruz. Como lembro tudo isso! Quanta saudade!

– Foi uma bela apresentação. O público entendeu e soube demonstrar sua admiração. Agora... Dos parabéns do “Marlon Brando”... disso eu não sabia!

– Olha aí... Não interprete as coisas, errado! Disso, conversaremos depois.

– Maria, vamos até o juazeiro, quero te mostrar uma coisa. É segredo.

– Segredo? Espero que seja agradável. Vamos.

Luíza pôs as mãos sobre meus olhos e conduziu-me até o juazeiro. Rodeamos a árvore três vezes e retirando a venda, disse: – Pode olhar!

– Meu Deus! Não estou acreditando. Nossos nomes gravados no tronco do juazeiro: Luíza, Margarida, Izabel, Nilza, João Bonfim, Guida, Francisca das Chagas, Genoveva, Socorro, Maria do Socorro, Glaucia, Maria das Graças, Marta, Maria de Jesus, Dúnnia, Evilázio, Raimundo, Agamenon, José Gerardo, Antônio Ademar... Oh! Luíza, foi uma ideia genial. Não poderia existir melhor forma de registrar aqueles momentos tão importantes de nossa infância e adolescência, senão aqui, no livro da Natureza, nesta árvore que está sempre cheia de vida.

– É isso mesmo, Maria. Esta é uma mensagem que ela passa para nós através dos tempos.

Estivemos ali por alguns minutos, sob o efeito benéfico do verde oxigênio e da suave lembrança que invadia nossos corações. Demo-nos as mãos e rodeamos a árvore mais uma vez. Uma lágrima rolou dos meus olhos, misturando-se às águas de um córrego que marulhava a alguns passos.

Maria de Jesus Araújo Carvalho


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Maria de Jesus Carvalho nasceu em Massapé, no Ceará. Fez seus primeiros estudos no Educandário Nossa Senhora do Carmo, um colégio particular, em sua cidade natal. Nas primeiras quatro séries, desenvolveu o gosto pela leitura. Os Cursos Ginasial e Normal, concluiu na Escola Normal, colégio interno dirigido pelas Irmãs de Caridade, em São Benedito, cidade serrana do Ceará e ali, já na adolescência, motivada pela carência da família, começou a fazer seus primeiros versos, herança de seu pai que era exímio na arte do soneto e de outros gêneros. Seu primeiro soneto foi fruto de uma decepção amorosa, aos dezesseis anos de idade. Além de poemas escreveu teatro infantil, paródias, letras de hinos, pequenos discursos, apresentados nas escolas onde lecionou – Português, Literatura Brasileira, Francês, Inglês e Música. Frequentou a Casa de Juvenal Galeno, Ala Feminina, de 1983 a 1986, em Fortaleza. Graduada em Letras (1977) e Direito (1981), pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e pós-graduada em Metodologia do Ensino Fundamental (1997), pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA). Atualmente publica seus textos no Recanto das Letras e no site Bric-à-Brac, do poeta Vicente Freitas.

quarta-feira, agosto 03, 2011

Literatura e Cangaço: e depois?

Lampião
Tenho o direito, creio, de me sentir um tanto deslocado numa mesa em que se discute o tema Literatura e Cangaço. Ocorre que sou um sujeito primordialmente urbano e meu contato com o sertão e seu entorno se deu de modo episódico. Quando estive em Sobral, no Ceará, pretendia dar prosseguimento a uma pesquisa que acabou permitindo maior contato com o calor e com a terra, mas também com o espaço. Pois foi ali que, em 1919, um eclipse solar total ficou famoso por haver comprovado a Teoria da Relatividade. Ali, naquele estado no qual Lampião encontrou uma das poucas pessoas que admirava, o Padre Cícero. Quanto à literatura que trata do cangaço e da vida sertaneja, creio estar em condições de abordar, no tempo gentilmente oferecido, alguns temas e algumas idéias que pretendo transmitir a partir de agora. Uma atitude mais correta seria a que não se deve jamais demonstrar diante do cangaceiro: a de provocação. Felizmente, estou entre debatedores que só lutam com idéias e diante de uma platéia a quem não cabe, segundo as regras estipuladas, perguntar ou reagir. Passo assim a apresentar as minhas considerações.

       Primeiramente, deve-se notar que o cangaceiro não escreve. O que implica afirmar que, estando fixado na memória dos seus contemporâneos, não deixou depoimento. Se fôssemos parodiar a fórmula de Euclides da Cunha, diríamos: o cangaceiro é, antes de tudo, um analfabeto. A sentença traz algum exagero, pois Lampião fora alfabetizado e teria lido a biografia de grandes líderes da política; e Corisco, também alfabetizado, chegou a ensinar a ler a sua mulher, Dadá. O cangaceiro se encontra, porém, na mesma situação do índio brasileiro – sua memória depende exclusivamente do depoimento alheio, do testemunho de quem o estudou. Pois, como se diz na melhor sociologia, tanto o índio quanto o cangaceiro não são plenamente sujeitos por não terem condições de escrever, eles mesmos, sobre suas experiências e pontos de vista.

       Note-se como nosso conhecimento sobre o cangaço seria diferente se um dos famosos cangaceiros houvesse deixado um depoimento à maneira, digamos, da favelada Carolina Maria de Jesus, em seu célebre Quarto de Despejo. Publicado em 1960, seu livro tornou-se um campeão de vendas e foi traduzido para dezenas de idiomas. Escrito em papéis de embrulho que ela recolhia todos os dias, num trabalho repetitivo e desgastante, o seu diário transmitia a vida da favela a partir da experiência sofrida de mulher e de negra. No Brasil marcado pela ideologia do desenvolvimentismo, as palavras de Carolina Maria de Jesus soavam como o contraponto necessário para que se tivesse consciência das implicações econômicas e políticas de um ambiente mal conhecido até mesmo dos escritores mais realistas.

       Em síntese, Carolina Maria de Jesus saía da indigência ao escrever, o que tinha muitas conseqüências. Ela era, para todos, uma catadora de papéis. Catava papéis durante o dia, mas, à noite, quando podia, defrontava-se com os papéis de seu caderno. Dia e noite, papéis do chão e papéis pautados eram o material de sua construção.

       A sua descrição da favela denota um intenso pessimismo: a escritora acompara freqüentemente a um inferno sem solução. Seu projeto é o de fugir, tão logo possível, daquela estrutura maldita. Algumas citações demonstram a eloqüência do seu sentimento: "Estou residindo na favela. Mas se Deus me ajudar hei de mudar daqui"; "O único perfume que exala na favela é a lama podre, os excrementos e a pinga"; "Aqui nesta favela a gente vê coisa de arrepiar os cabelos. A favela é uma cidade esquisita e o prefeito daqui é o Diabo".

       O índio e o cangaceiro, portanto, precisaram de outras vozes para que se fizessem ouvir. Ambos fazem parte de um segmento importante dos estudos sociológicos e literários que procuram entender o fenômeno da sua aparição e da sua sofrida sobrevivência.

       No poema “Antonio Silvino no Engenho Poço”, João Cabral de Melo Neto parece captar a dificuldade que o cangaceiro tem de se expressar, de dizer uma palavra ou de explicar a que vem. Um dos pioneiros do cangaço, o pernambucano Antonio Silvino visita o avô do poeta, fazendeiro, que caminhava na varanda da sua casa, ao final do almoço. Depois de saudar o senhor de engenho, eis que não consegue mais prosseguir. E o poeta escreve, rememorando a história contada em família:

Uma pausa. Parou de dizer.Mas a pausa não tem por quê.Se sente sua hesitaçãoplanando no ar, como gavião. (...)
       Em seguida, e após observar que o cangaceiro fugia e viajava só, tendo sofrido um ataque da polícia que dispersara o seu bando, o poeta transcreve em versos as palavras do avô:
João de Melo chama: 

“Marocas,sabe quem veio aqui agora?Antonio Silvino: ia sozinho,sem mesmo o pajem de um menino.Não tinha mesmo um guarda-sol.Mas na garganta tinha o nóde quem quer pedir uma coisamas se afoga nela, e não ousa. (...)Mas o que terá impedidode me fazer qualquer pedido? (...)

       E o avô, nas palavras do poeta, arremata a sensação de quem não conseguiu arrancar as palavras do cangaceiro:

De gosto, o haveria atendido.Ele não é um simples bandido.E repugna-me sabê-lo caçada polícia que não o faz de graça.

       Em que pese a cautelosa opinião de João de Melo, avô do poeta, ainda subsiste, no caso do cangaceiro brasileiro, uma tendência forte de classificá-lo como “bandido social”. Como sabemos todos, foi Eric Hobsbawm quem cunhou o termo “banditismo social” num livro de 1959, intitulado Rebeldes Primitivos. O seu interesse pelas formas arcaicas dos movimentos sociais nos séculos XIX e XX foi revisto em Bandits, de 1976, no qual o historiador britânico deu forma definitiva à sua análise. Para ele, o quadro que propiciou o cangaço vinculava-se a movimentos de camponeses revoltados com o avanço das formas modernas de produção. Esse avanço ameaçava valores como o da importância do patriarca, o acesso à terra e a uma série de aspectos simbólicos relacionados à propriedade, à família e ao trabalho. Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, foi classificado pelo historiador como vingador. Sua preferência compulsiva pela destruição e sua aparente incapacidade de pertencer a este ou aquele interesse de classe já promoveram diversas especulações: teria sido um psicopata, uma espécie de serial killer interessado em defender a violência como meio de se atingir a honra? Teria sido um crítico, a seu modo, da injustiça social em franco processo de protesto? Teria sido um rebelde à força da modernidade, quando esta afetava os valores do ambiente em que viveu? Lembro que já Antonio Silvino havia entrado em conflito com os engenheiros e funcionários da Great Western, quando a empresa britânica implantava trilhos no sertão paraibano.

       A análise de Eric Hobsbawm, embora prestigiada e de grande influência nos estudos de História e Sociologia, foi muito criticada ora por suas aparentes simplificações, ora pela tipificação idealizada dos exemplos citados, ora pela dificuldade de criticar o banditismo social como forma de protesto. Anton Blok, antropólogo e estudioso das famílias ou empresas mafiosas, apontou a contradição de considerar como críticos da sociedade ou mesmo guerrilheiros os bandidos que, afinal, vitimaram camponeses de sua sociedade, muitas vezes em cumplicidade com representantes da classe dominante. E foi justamente a análise profunda de tal cumplicidade que permitiu ao professor Richard Slatta – um estudioso, entre outros assuntos, do fenômeno dos cowboysnorteamericanos e dos gauchos – a empreender uma revisão das idéias de Eric Hobsbawm e identificar a possibilidade de que muitos dos bandidos sociais estivessem, de fato, à procura de uma carreira individual e de um lugar proeminente em sua sociedade.

       Nos estudos que buscam explicar o cangaço, contemporâneos ou não do fenômeno, predomina a análise sociológica, segundo a qual o homem honesto e trabalhador se vê transformado em bandido – como é a opinião, por exemplo, de Xavier de Oliveira, nascido no Cariri, e de Gustavo Barroso. O primeiro autor descreve a “feira de trabalhadores” na sua região, na qual muitos ansiavam, com enxada nos ombros, um fazendeiro que iria escolhê-los para a labuta. O fazendeiro selecionava apenas os mais fortes ou os que lhe pareciam mais aptos, e assim centenas de homens ficavam, com suas mulheres e filhos, sem ter o que fazer e o que comer. A revolta vinha dessa situação de injustiça e de desesperança, na qual os homens sem terra e sem ocupação definida ficavam expostos à exploração contínua e intensa do seu trabalho. Um relato clássico sobre o assunto nos é apresentado por Rui Facó no seu livro Cangaceiros e Fanáticos (1976), no qual passam por nossos olhos as mazelas que se encontram na origem mesma do surgimento de personalidades como Antonio Silvino, Lampião, Corisco, e tantos outros: a ausência de justiça, o analfabetismo, a precariedade dos transportes e da comunicação, problemas aos quais se somava a concentração da propriedade da terra, que concedia poder e recursos econômicos quase ilimitados a uma minoria, impondo a uma vasta massa o regime de semiservidão.

       Mas o latifúndio que produz o revoltoso também o alimenta. E sua força econômica era tamanha que tinha até mesmo meios de corromper o cangaceiro e colocá-lo a seu serviço, transformando-o em jagunço pronto para defender os interesses do proprietário. Essa mutação foi também compreendida por Rui Facó, cujas palavras, por sua expressão, valem ser citadas:
O cangaceiro rebelado se transforma em ´cangaceiro manso`. É o capanga ou jagunço (...). Os próprios bandos autônomos se vêem enredados nas malhas do latifundiário. Para fugir às perseguições da polícia, ocultam-se no melhor lugar onde podem fazê-lo com segurança – uma grande fazenda, abrigo em geral inviolável. E seu campo de ação torna-se vastíssimo sob a proteção do coiteiro.

       Num trecho de Viventes das Alagoas (1962), Graciliano Ramos conseguira definir a relação entre proprietários e cangaceiros, que muitas vezes era de integral cumplicidade: “O ladrão de cavalos é o inimigo pequeno, que se pode oprimir. O cangaceiro é o inimigo poderoso, que é necessário agradar.” (p.125)

       Assim era o quadro desolador, ao qual iria juntar-se ainda o elemento religioso, cujo representante maior era o Padre Cícero, apoiado primeiramente pela elite local.

       O cangaceiro estava, pois, sob pressão da mesma estrutura que pesava sobre o retirante Severino, do poema de João Cabral de Melo Neto. Ao deixar a sua região para trás, migra em vez de se tornar um bandoleiro em sua própria terra, mas continua acossado pela fome. É um retirante, ou seja, um fugitivo sem violência, uma pessoa sem espírito de vingança, um nômade infeliz, um passivo na sua impressionante resistência física e moral. Em busca de trabalho, percorre um caminho que afinal se mostra o do seu próprio enterro. É ele, Severino, quem se dirige a uma mulher que está na janela:

- E se pela última vezme permite perguntar;não existe outro trabalhopara mim neste lugar?E a mulher lhe responde:- Como aqui a morte é tantasó é possível trabalharnessas profissões que fazemda morte ofício ou bazar. (...)Só os roçados da mortecompensam aqui cultivar,e cultivá-los é fácil;simples questão de plantar;
       Na paisagem do sertão, já se percebeu que o inimigo do cangaceiro pode ser a volante ou o policial; mas ainda não se notou que o contrário do cangaceiro é o retirante. Comparado ao retirante, o cangaceiro é um destruidor, que avoluma a sua presença na terra seca, em vez de fugir dela. Sua sobrevivência consiste justamente em ficar, porém de maneira perturbadora e contestadora, como se estivesse pronto para transmitir a morte que já o contaminou. Talvez por ter decidido ficar na sua terra e destruir a ordem constituída, o cangaceiro seja percebido, também na literatura, como uma figura violenta, mas ambígua; sanguinária, mas polêmica. Ora o cangaceiro é um herói, ora um assassino; ora movido pelo desejo de vingar uma falta cometida, ora por uma ansiedade irracional de impor degola, tortura e sofrimento àqueles que nem mesmo conhecia. O justiceiro se confunde ao covarde. E o cangaceiro, por ser ele mesmo resultado de uma ordem política e econômica que só gera riqueza para poucos, se define assim por ser, antes de tudo, um forte-fraco.

       A sua alta mobilidade – de quem mora em movimento sobre a terra – torna-o o terror iminente de toda a região, como se ele pudesse saltar subitamente de um canavial ou da escuridão para proferir sua sentença mortal. A sua capacidade de aniquilar qualquer um foi captada de modo notável numa passagem de Seara Vermelha (1946), na qual Jorge Amado escreveu:
Aqui, na caatinga, habitam os cangaceiros. Os soldados da vingança, os donos do sertão. Não têm paz nem descanso, não têm quartel nem bivaques, não têm lar nem transporte. Sua casa é seu quartel, sua cama e sua mesa são a caatinga, para eles bem-amada. Os soldados da polícia que o perseguem não se atrevem a penetrar por entre os arbustos de espinhos, os pés de xiquexiques e coás. Ao lado das serpentes e dos lagartos, vivem os cangaceiros na caatinga, e também eles, por vezes, liquidam no tiro das suas repetições os sertanejos que descem e que sobem na contínua migração.

       O movimento como que rotativo das pessoas na paisagem sertaneja parece magistralmente registrado pelo romancista baiano: ali se encontram cangaceiros, soldados, serpentes, lagartos e o povo geral do sertão que ora encontram refúgio, ora encontram obstáculo na vegetação espinhenta. Existe uma interessante oposição entre os “soldados da vingança”, os cangaceiros, e os “soldados da polícia”. O movimento de “contínua migração” dos sertanejos parece comunicar-se a um moto perpétuo de fugas e de perseguições, sendo os cangaceiros trazidos à dimensão dos animais rastejantes. Lembro, a propósito, que muitos cangaceiros eram conhecidos somente por suas alcunhas, retiradas da flora e da fauna local: Arvoredo, Bananeira, Cajazeiras, Cajueiro, Cobra Preta, Fura Moita, Gavião, Jaçanã, Jandaia, Jararaca, Jiboião, Jitirana, Juriti, Moita Braba, Moitinha, Mourão, Saracura, entre tantos outros.

       A descrição da moradia dos cangaceiros – a terra seca – e da sua relação com a geografia não esconde, contudo, outras dimensões fascinantes que foram aproveitadas pela literatura. O banditismo não esteve apenas limitado a uma reivindicação animalesca por tudo aquilo que faltava materialmente ao homem do sertão. No exercício violento de resistência e de esperança que caracteriza a ação dos cangaceiros, também se exibia o misticismo – quase sempre protagonizado por grupos de fanáticos que igualmente ansiavam por um mundo melhor. Esses movimentos, caracterizados pelo messianismo, também impactaram a opinião pública e, nela, os escritores, por sua força dramática e pela revelação do poder que os envolvia.

       Antes mesmo de descrever a figura de Antônio Conselheiro e de narrar a campanha de Canudos, Euclides da Cunha buscou compreender o fenômeno religioso entre os sertanejos, e concluiu que “da consciência da fraqueza para debelar [os elementos da terra], resulta, mais forte, este apelar constante para o maravilhoso, esta condição inferior de pupilo estúpido da divindade.” (p.97) Numa breve passagem de Os Sertões (1902), narra o episódio da Pedra Bonita, ocorrido na comarca de Pajeú, Pernambuco, em 1837. Ali houve um profeta que prometeu aos seus seguidores o ingresso no reino encantado de Dom Sebastião. Para tanto, era preciso quebrar a grande pedra “não a pancadas de marreta, mas pela ação miraculosa do sangue das crianças, esparzido sobre ela em holocausto (...)” (p.98). Somente assim aquele rei voltaria, “cumulando de riquezas os que houvessem contribuído para odesencanto.” O fato histórico, horroroso em si, poderia ser ainda mais impressionante se o escritor lembrasse de narrar que homens e mulheres foram também sacrificados naquela ocasião – e até mesmo os cães, pois havia a promessa de que seriam transformados em dragões alados pela mesma magia prometida... Terminado o sacrifício, o que se verificou foi a impossibilidade de permanecer naquele local quando os corpos começaram a apodrecer.

       Foi esse episódio que constituiu a matéria de Pedra Bonita (1938), de José Lins do Rego no qual surpreende a afirmação do autor de que “a narrativa deste romance quase nada tem a ver com a geografia e o fato histórico desenrolado em Pernambuco nos princípios do século XIX.” É preciso salientar ao máximo o advérbio quase, pois o escritor oferece, de fato, uma mescla de relato histórico e de ficção que conduz todo livro. Esquematicamente, a história se fundamenta na tensão entre duas cidades, a Vila do Açu e Pedra Bonita. Essa tensão se agiganta porque os moradores da Vila do Açu se sentem estigmatizados por uma maldição que foi urdida na cidade vizinha, enquanto os de Pedra Bonita amaldiçoam a família Vieira, daquela cidade, pelo antepassado que denunciou os ritos religiosos que provocaram o sacrifício humano.Cangaceiros (1953) dará continuidade a um aspecto presente em Pedra Bonita, a da aparição do vingador, forjando o capitão Aparício a partir da história, em alguns pontos exagerada, de Lampião. Em ambos os romances, há uma quantidade de informações sociológicas que nem sempre se harmonizam à matéria ficcional. Mas há também a oportunidade de seguir a evolução de criações como a do cantador Dioclécio, do cantador Domício e muitos personagens populares que fazem do sertão brasileiro um lugar singular e imprevisível.

       Enfim, desde O Cabeleira (1876), de Franklin Távora, até A Pedra do Reino(1971), de Ariano Suassuna, a violência do cangaço e a demência da religiosidade marcam a literatura brasileira em sua vertente regional. E agora não pretendo abrir nova vereda para a literatura popular de cordel, tema para outra conferência, uma vez que enfrenta o problema do cangaço de um modo bipolar: ora intensificando os episódios de maldade, tortura e aniquilamento; ora idealizando o mito do cangaceiro, conferindo-lhe qualidades de semideuses e de vítimas do seu meio, mas dotados de valentia assombrosa, como quis um cantador ao narrar Antonio Silvino e seu bando:

Já ensinei aos meus cabrasA comer de mês em mês,Beber água por semestre,Dormir no ano uma vez...Atirar em um soldadoE derrubar dezesseis!

       Minhas palavras finais não procuram concluir, mas buscar compreender o cangaço com conceitos que, infelizmente, se tornaram mais conhecidos nos tempos atuais. Raramente se fez referência ao cangaço como fenômeno que implica atos de terrorismo. O mais comum é perceber as ações do cangaceiro como violência, esvaziada de qualquer dimensão ou causa política. Reduzido a bandido, sem apresentar reivindicação ou sem projeto social, o cangaceiro buscaria prestígio social, enriquecimento ainda que provisório e, portanto, ascensão. Nos meios diplomáticos e nos centros de estudo internacionais, vem sendo analisado o fenômeno da radicalização e da violência política. O recente desaparecimento de Osama bin Laden fez o mundo rever a pessoa de um terrorista: outrora sua imagem aparecia tendo por fundo as montanhas e as grutas onde se escondia, como se fosse ele mesmo representante de um irredentismo que tem dimensões planetárias. Em seu discurso, havia sempre o sentido da missão entre política e religiosa e sua luta contra potências mundiais, com alta violência e ameaças de catástrofes. Relativamente isolado do mundo, se opunha aos valores das sociedades modernas e mais avançadas. Há muitos traços comuns ainda a explorar entre o cangaço e o terrorismo na forma como agora os vemos. Mas persiste a crença de que existe nos dois movimentos, antes de tudo, um elemento autodestrutivo e a impossibilidade de que persistam na sua atuação destruidora enquanto as sociedades evoluírem.

Palestra apresentada em 26 de maio, na Academia Brasileira de Letras, por ocasião do seminário “Literatura e Cangaço”.

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Felipe Fortuna
 nasceu no Rio de Janeiro, em 1963. Mestre em Literatura Brasileira (PUC/RJ), é poeta e ensaísta, e vem colaborando regularmente na 
imprensa brasileira. Publicou Ou Vice-Versa (1986), Atrito (1992) e Estante (1997), poemas; A Escola da Sedução (1991) e A Próxima Leitura (2002), crítica literária; Curvas, Ladeiras - Bairro de Santa Teresa (1997) eVisibilidade (2000), ensaios. Traduziu a obra integral da poeta francesa Louise Labé no volume Amor e Loucura (1995). Diplomata, atualmente trabalha em Londres. Em 2005, publicou um novo livro de poemas, juntamente com os três anteriores, no volume Em Seu Lugar (Editora Francisco Alves). 
E-mail: felipefortuna@felipefortuna.com