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“Psi, a Penúltima”, de Soares Feitosa |
𝐎 𝐂𝐚𝐧𝐭𝐨 É𝐩𝐢𝐜𝐨 𝐝𝐨 𝐒𝐞𝐫𝐭ã𝐨 𝐞 𝐝𝐚 𝐆𝐫é𝐜𝐢𝐚
“Psi,
a penúltima”, de Soares Feitosa, é uma obra monumental que cruza as fronteiras
do sertão nordestino para se encontrar com a antiga Grécia, numa fusão ousada
de dois mundos literários. O poeta, conhecido por sua habilidade em fundir
culturas e narrativas, cria uma epopeia moderna que ao mesmo tempo resgata e
recria os mitos gregos e nordestinos. Com esta obra, Feitosa inaugura uma
poética híbrida, onde o sertão se transforma no palco de uma odisseia que
ressoa as vozes épicas da Antiguidade, transportando-as para as vastas
planícies áridas da caatinga.
Soares
Feitosa, ao evocar as tradições épicas da Grécia antiga, como as narrativas de
Homero, insere essas histórias clássicas em um novo ambiente: o sertão. Esse
deslocamento geográfico e cultural resulta em uma poderosa intersecção entre o
arcaico e o moderno, o distante e o familiar. No sertão, figuras míticas como
heróis e deuses adquirem novas formas e significados. As divindades gregas se
misturam às figuras locais, enquanto o sertanejo se eleva ao status de herói,
enfrentando as agruras de um ambiente inóspito e, ao mesmo tempo, resgatando a
dignidade do homem comum.
A
epopeia de Feitosa não se limita a uma simples transposição de cenários. O
sertão, com sua brutalidade e beleza, torna-se parte do enredo, imbuído de
elementos míticos que se misturam às paisagens secas, à cultura do cangaço e à
luta pela sobrevivência. O poeta cria uma mitologia própria do sertão, onde as
lendas regionais encontram eco nos mitos da Grécia, numa combinação rica de
tradição e inovação.
A
caatinga, em “Psi, a penúltima”, não é apenas um cenário geográfico, mas um
elemento fundamental na construção da narrativa. É um espaço onde os desafios se
encontram com o divino, onde a vastidão do deserto nordestino evoca as
planícies áridas da Grécia antiga. Soares Feitosa explora as metáforas do
sertão, onde a seca, a fome e a brutalidade do ambiente servem de pano de fundo
para uma nova forma de heróis. Aqui, o sertanejo enfrenta o implacável com a
mesma coragem dos heróis gregos, como Aquiles ou Odisseu, mas com armas
diferentes: a resistência e a astúcia de quem conhece os segredos da terra.
A
caatinga se torna, assim, o palco de uma epopeia moderna, onde o sertão é
simultaneamente um espaço mítico e histórico. As montanhas, os rios secos e as
árvores retorcidas pela seca são descritos com uma força simbólica que dialoga
com a geografia emocional da narrativa épica. No sertão de Feitosa, o arcaico e
o contemporâneo convergem, fazendo do cenário uma metáfora.
Um
dos grandes méritos de Soares Feitosa em “Psi, a penúltima” é sua capacidade de
criar uma linguagem poética que une a erudição do épico com a oralidade
popular. O poeta utiliza uma dicção que ecoa tanto a grandiosidade dos versos
homéricos quanto a simplicidade das cantigas sertanejas, formando uma ponte
entre a sofisticação clássica e a riqueza cultural do Nordeste brasileiro.
Feitosa
utiliza o verso livre, mas com uma musicalidade que remete às cadências épicas,
onde o ritmo lento e solene se alterna com momentos de tensão e intensidade. Ao
mesmo tempo, ele recorre à repetição, à anáfora e à construção circular,
recursos próprios da poesia oral, que ampliam a dimensão épica da obra. A
linguagem poética não apenas narra a história, mas a faz fluir como uma
corrente de rio, sinuosa e profunda.
Se
na Grécia antiga os heróis épicos eram figuras de grande nobreza, em “Psi, a
penúltima”, o sertanejo ocupa esse lugar. Através de uma narrativa que exalta a
resistência, a luta contra a adversidade e a dignidade diante da miséria,
Soares Feitosa eleva o homem comum à condição de herói trágico. No sertão, onde
a seca e a falta de recursos impõem desafios diários, a figura do sertanejo se
transforma em um símbolo de persistência e superação.
Essa
heroização do homem nordestino não é gratuita, mas sim uma homenagem ao povo
que, como os heróis gregos, enfrenta forças além do seu controle e, mesmo
assim, mantém sua humanidade. A jornada do sertanejo é tanto física quanto
espiritual, e sua odisseia é permeada pela busca de sentido em um mundo árido,
onde o ciclo da vida e da morte se repete implacavelmente.
A
obra de Soares Feitosa não é apenas uma recriação mítica do sertão, mas também
um reflexo das tensões sociais e históricas que atravessam o Nordeste. Ao
trazer o sertão para o centro de uma epopeia, o poeta coloca em evidência as
questões da desigualdade, da luta pela terra e da resistência cultural. O
sertão não é apenas um espaço literário, mas um território de lutas concretas,
onde a sobrevivência é uma forma de resistência.
Em
“Psi, a penúltima”, o épico não está separado da realidade; pelo contrário, a
mitologia e a história se entrelaçam, criando uma narrativa que, ao mesmo tempo
que celebra o sertão, denuncia suas contradições. O sertanejo é o herói que
luta contra as adversidades, mas também é a figura que carrega o peso das
injustiças e do abandono histórico.
O
título da obra, “Psi, a penúltima”, carrega uma simbologia que remete ao fim de
um ciclo, mas não ao seu encerramento definitivo. A letra “Psi”, no alfabeto
grego, é a penúltima, sugerindo que a jornada épica do sertão ainda está em
curso, que há mais histórias a serem contadas, mais batalhas a serem travadas.
Feitosa parece nos lembrar que, embora a epopeia do sertão esteja perto do fim,
ainda há esperança.
“Psi, a penúltima” é uma obra que transcende
os limites da literatura regional, transformando o sertão em um espaço épico,
onde o passado e o presente, o mito e a realidade se encontram. Soares Feitosa,
com sua linguagem poética magistral e sua capacidade de construir pontes entre
culturas, cria uma epopeia contemporânea que, ao mesmo tempo, é universal e
profundamente enraizada no Nordeste brasileiro.
A
obra é um canto épico do sertão, onde o homem comum se transforma em herói, e a
paisagem árida se torna o cenário de uma odisseia moderna. Feitosa, ao unir o
sertão e a Grécia, faz uma declaração poderosa sobre a universalidade do homem,
mostrando que, mesmo nos cantos mais remotos do mundo, há espaço para a
grandeza.
𝐀 𝐉𝐨𝐫𝐧𝐚𝐝𝐚 𝐏𝐨é𝐭𝐢𝐜𝐚 𝐝𝐞 𝐑𝐞𝐧𝐨𝐯𝐚çã𝐨
A
obra Psi, a penúltima, de Soares Feitosa, marca uma nova fase na poesia
contemporânea brasileira, onde o regionalismo nordestino se encontra com as
forças universais da literatura e da cultura. Feitosa, conhecido por sua
habilidade em entrelaçar o cotidiano sertanejo com elementos épicos, cria um
universo poético em que o regional não é uma limitação, mas uma porta para um
entendimento mais amplo.
Feitosa
se descobre poeta não apenas ao narrar, mas ao redesenhar o próprio universo
poético do Nordeste. O livro é uma verdadeira jornada em que o autor revisita
temas ancestrais, como a seca e a caatinga, e os projeta em um cenário de
renovação espiritual e cultural. Essa renovação, porém, não é uma ruptura com o
passado, mas uma expansão em que o presente e o futuro se entrelaçam com as
tradições, como se o próprio tempo fosse uma matéria moldável nas mãos do
poeta.
Desde
os primeiros versos de “Psi, a penúltima”, Feitosa constrói uma geografia
emocional onde o sertão nordestino, com suas paisagens áridas e castigadas pela
seca, surge não apenas como um cenário, mas como um personagem vivo. As
montanhas, os rios secos e as veredas de terra rachada se transformam em
símbolos de resistência, transformação e, paradoxalmente, de abundância
espiritual. O sertão, em Feitosa, é elevado à categoria de um espaço
mitológico, onde o épico e o lírico convivem.
A
terra, enquanto elemento primordial, atua como metáfora para o processo
criativo do poeta, que a transforma e a recria. A aridez do solo contrasta com
a fertilidade da mente poética de Feitosa, que faz brotar novas ideias a partir
do que aparentemente está estéril. O autor, com suas palavras precisas e
cortantes, faz ecoar a universalidade do humano por meio do local, mostrando
que o Nordeste é ao mesmo tempo específico e vasto em significados.
O
regionalismo de “Psi, a penúltima” não é uma prisão para Soares Feitosa; é um
trampolim. Se, à primeira vista, o leitor pode se sentir imerso em uma
atmosfera profundamente nordestina, logo perceberá que Feitosa não está apenas
pintando uma paisagem familiar para os habitantes dessa região. Ele está
utilizando essas imagens para explorar questões universais como a luta pela
sobrevivência, a relação do homem com a terra e o inexorável fluxo do tempo.
Ao
descrever a seca e suas consequências, Feitosa vai além da mera descrição; ele
transforma o fenômeno natural em um arquétipo de resistência e transcendência.
A seca, com sua brutalidade, obriga o sertanejo a buscar dentro de si a força
para sobreviver. Assim, Feitosa transforma a narrativa de sofrimento em uma
jornada de autodescoberta e renovação. O regionalismo, nesse contexto, se
dissolve nas camadas mais profundas, tornando a poesia de Feitosa relevante
para leitores de todas as partes do mundo.
Outro
aspecto marcante de “Psi, a penúltima” é a maneira como Soares Feitosa constrói
seus personagens. Os homens e mulheres que povoam seu universo poético não são
meros retratos do sertanejo comum; eles são arquétipos que transcendem o tempo
e o espaço. O vaqueiro, o agricultor e o retirante, figuras tão comuns na
literatura nordestina, assumem em Feitosa uma dimensão quase mítica.
Esses
personagens estão em constante movimento, não apenas físico, mas também
espiritual. A jornada que empreendem é uma busca por sentido, por redenção e
por um lugar no mundo que, muitas vezes, parece lhes negar a própria
existência. A solidão do sertão reflete a solidão do ser humano na vastidão do
universo, e Feitosa, ao explorar essas figuras arquetípicas, dialoga com temas
universais de identidade, destino e transcendência.
Uma
das maiores conquistas de “Psi, a penúltima” é a maneira como Feitosa lida com
o tempo e o espaço. A obra é ao mesmo tempo atemporal e profundamente enraizada
em um lugar específico. Feitosa consegue superar as fronteiras da geografia e
da história, fundindo-as em uma narrativa poética que se desdobra como uma
espiral, em vez de seguir uma linha cronológica rígida.
O
poeta nos leva a diferentes épocas, cruzando tempos históricos e mitológicos,
sem perder a conexão com o presente. É como se a história do sertão e de seus
habitantes fosse um ciclo contínuo de morte e renascimento, onde cada geração
repete, de alguma forma, os erros e acertos da anterior, mas sempre com a
esperança de uma renovação espiritual.
Embora
o sertão de Feitosa seja um lugar físico e concreto, ele é também um espaço
simbólico onde se desenrola uma jornada espiritual. A aridez do solo reflete a
aridez da alma, e a busca por água é também uma busca por sentido. O “Psi” do
título, letra grega que tem associações com o espírito, parece sugerir que a
jornada poética de Feitosa é uma busca por transcendência.
Essa
busca, no entanto, não é linear nem simples. É uma jornada cheia de obstáculos,
onde a redenção parece sempre estar no horizonte, mas nunca plenamente ao
alcance. O poeta reconhece a fragilidade do homem nordestino, mas também
celebra sua capacidade de resistir, de se renovar e de, eventualmente,
encontrar um sentido, mesmo nas condições mais adversas.
“Psi,
a penúltima” é uma obra que revela o amadurecimento poético de Soares Feitosa.
Ele transcende o regionalismo sem abandoná-lo, usa o sertão como uma metáfora e
transforma as paisagens áridas e os personagens comuns em símbolos de uma
jornada maior. A poesia de Feitosa não se contenta em apenas descrever a
realidade; ela a recria, a renova e a expande, tornando-a universal.
𝐀 𝐒𝐢𝐦𝐛𝐨𝐥𝐨𝐠𝐢𝐚 𝐝𝐨 𝐓í𝐭𝐮𝐥𝐨 𝐞 𝐨 𝐅𝐢𝐦 𝐈𝐧𝐜𝐨𝐦𝐩𝐥𝐞𝐭𝐨
Soares
Feitosa, em “Psi, a penúltima”, constrói uma obra profundamente reflexiva,
ancorada em um título que, por si só, já provoca uma vasta gama de
interpretações. A simbologia do título revela-se como um elemento central para
a compreensão do livro, onde a letra “psi”, a penúltima do alfabeto grego,
carrega uma representação de final que não se concretiza. Essa escolha é mais
do que um simples artifício linguístico ou estilístico: ela capsula um conceito
filosófico e artístico, refletindo a constante tensão entre o término e a
perpetuação.
A
noção de um fim incompleto, expressa no subtítulo “a penúltima”, evoca uma
sensação de suspensão. Estamos sempre à beira do fim, mas nunca o alcançamos
verdadeiramente. O uso de “penúltima” confere à obra uma qualidade provisória,
como se ela estivesse sempre em processo, em constante transformação, como se
cada página escrita pudesse ser a última, mas não é. A obra não se permite o
fechamento absoluto, mantendo o leitor em um estado de expectativa, quase como
se estivesse preso em um eterno quase-fim.
A
escolha da letra grega “psi” vai além de seu posicionamento alfabético. “Psi” é
frequentemente associada ao campo da psicologia, denotando a mente, suas
profundezas e complexidades. Essa conexão com o psíquico sugere que Feitosa
está lidando com questões de identidade, consciência e introspecção. Ao
posicionar sua obra no limiar entre o fim e a continuidade, ele convida o
leitor a uma jornada mental, onde a introspecção é contínua e a conclusão,
inatingível.
Além
disso, “psi” também está associada ao estudo das ciências ocultas e da metafísica,
especialmente no que se refere às forças invisíveis que governam o universo.
Essa associação amplia o campo de interpretação da obra, sugerindo que, para
Feitosa, a arte é uma forma de explorar o desconhecido, o invisível, e talvez
até o inefável. A penúltima letra, então, representa essa busca que nunca
encontra seu fim definitivo, mas que permanece como uma promessa ou um mistério
a ser desvendado.
Em
“Psi, a penúltima”, Feitosa parece dialogar com a própria natureza da criação
artística. A obra é um reflexo da experiência do artista, que está sempre em
busca de uma completude que nunca é plenamente alcançada. A arte, nesse
sentido, é um processo infinito de tentativa e erro, de aperfeiçoamento e de
recomeço. A ideia de que a obra nunca está realmente concluída desafia a noção
tradicional de que um livro ou uma obra de arte precisa de um ponto final, de
um desfecho.
Para
Feitosa, essa incompletude não é uma falha, mas uma característica essencial da
criação artística. O título da obra indica uma aceitação dessa condição, um
reconhecimento de que o verdadeiro fim talvez nunca chegue, mas que isso não
invalida a busca. Pelo contrário, essa busca é o que impulsiona o artista a
continuar, a escrever a próxima linha, a procurar a próxima ideia.
O
conceito de uma eternidade em suspensão atravessa toda a obra de Feitosa. “Psi,
a penúltima” é, em muitos aspectos, uma meditação sobre o tempo e a finitude.
Ao nunca alcançar o fim, a obra perpetua-se indefinidamente, projetando-se para
um futuro que nunca se concretiza. Essa eternidade, contudo, não é estática;
ela está sempre em movimento, sempre à beira de algo, mas nunca chegando ao
destino final.
Essa
abordagem faz eco às ideias filosóficas de figuras como Zenão de Eleia (considerado
por Aristóteles como o criador da dialética), cujos paradoxos sugerem que o
movimento e a mudança são ilusões, ou de Jorge Luis Borges, cujas obras muitas
vezes brincam com a noção de um tempo circular e infinito. Feitosa, ao
trabalhar com a ideia de um fim que nunca chega, insere-se nessa tradição
filosófica e literária, questionando a natureza do tempo, do espaço e da
criação artística.
“Psi,
a penúltima” não é apenas um livro, mas uma declaração artística sobre a
própria impossibilidade de concluir. A obra de Soares Feitosa é um lembrete de
que o fim, seja na arte ou na vida, é sempre provisório, sempre adiado. Ao
escolher a penúltima letra do alfabeto grego, Feitosa capsula essa ideia de
incerteza e perpetuação, oferecendo ao leitor uma obra que permanece aberta, incompleta
e, por isso mesmo, infinitamente rica em possibilidades.
O
leitor, portanto, não encontra um fechamento ao término do livro, mas sim uma
nova abertura, uma nova porta para o desconhecido. A experiência da leitura
torna-se, assim, um espelho da própria vida: uma jornada sem fim, onde cada
conclusão é apenas o prelúdio para uma nova exploração.
𝐎 𝐌𝐮𝐥𝐭𝐢𝐧𝐨𝐫𝐝𝐞𝐬𝐭𝐢𝐧𝐨
Soares
Feitosa, em “Psi, a penúltima”, surge como um poeta de múltiplas vozes, um
“multinordestino” que ultrapassa as fronteiras geográficas e culturais do
Nordeste brasileiro. Ele não apenas canta as belezas e agruras de sua terra,
mas faz do sertão um ponto de intersecção com o mundo ocidental clássico,
tecendo um diálogo profundo entre o local e o universal, o sertanejo e o
mítico. A partir dessa fusão, Feitosa redefine a identidade cultural do
Nordeste, ampliando suas referências e possibilidades.
O
termo “multinordestino” é uma espécie de manifesto identitário que aponta para
a pluralidade das experiências e influências culturais que o autor incorpora. O
Nordeste, na obra de Feitosa, não é mais um lugar isolado, perdido na vastidão
do Brasil, mas sim um espaço de confluência de saberes que dialoga com o mundo.
Em “Psi, a penúltima”, o sertão, tradicionalmente visto como uma região árida e
de poucas oportunidades, é retratado como um território de criação intelectual
e espiritual, onde o antigo e o moderno, o mítico e o contemporâneo coexistem
em harmonia.
Uma
das características mais notáveis de Feitosa em “Psi, a penúltima” é sua
capacidade de transcender a geografia nordestina ao associá-la a paisagens
míticas e figuras da tradição grega. Ao fazê-lo, ele não abandona a essência do
sertão, mas o eleva a um patamar de universalidade. Essa abordagem ressoa com o
conceito do topos mítico, onde o espaço literário transcende seu referencial
imediato para se tornar um símbolo de experiências universais. Feitosa consegue
transformar o sertão em um campo mítico ao integrá-lo com referências à Grécia
clássica, como se o árido chão nordestino fosse parte de uma paisagem épica que
abrigou tanto o herói homérico quanto o vaqueiro sertanejo.
A
obra “Psi, a penúltima” sugere que as fronteiras culturais são, muitas vezes,
artificiais, e que há uma correnteza subterrânea ligando o sertão brasileiro às
tradições ocidentais, notadamente a grega. Essa fusão permite ao poeta
transcender as limitações geográficas e culturais, criando um espaço literário
onde o Nordeste se torna não apenas um local físico, mas um estado de espírito
e uma construção mítica. A referência à tradição grega, com seus mitos e
tragédias, aproxima o sertão de uma dimensão épica, onde o homem do campo e o
herói mítico compartilham dilemas existenciais semelhantes.
Soares
Feitosa se coloca como uma espécie de mediador cultural, um tradutor entre
mundos. Ele não apenas transporta o leitor para o sertão, mas também abre as
portas para um diálogo com a antiguidade clássica. Através de sua poesia, o
sertão nordestino se torna um espaço que contém múltiplas temporalidades e universos.
Em “Psi, a penúltima”, Feitosa propõe um encontro entre o passado mítico da
Grécia e o presente árido do Nordeste, mas sem idealizações; ele apresenta o
sertão com todas as suas contradições e dificuldades, ao mesmo tempo que o
coloca em um patamar de reflexão filosófica e estética.
O
poeta não se limita à narrativa da pobreza e da seca, temas frequentemente
associados à literatura nordestina. Em vez disso, ele explora questões de
transcendência cultural, buscando conexões entre as tragédias do sertão e as
tragédias gregas, entre o ethos do homem simples e o heroísmo trágico dos mitos
antigos. Essa aproximação eleva a cultura nordestina ao status de um patrimônio
cultural global, sem perder sua autenticidade e raízes.
Ao
integrar a tradição grega ao seu repertório poético, Feitosa desafia os limites
tradicionais da poesia regionalista, geralmente associada a uma visão estática
e limitada do Nordeste. Em vez de retratar o sertão como um espaço de exclusão
e isolamento, ele o transforma em um local de encontros e trocas culturais. O
Nordeste é, em “Psi, a penúltima”, o ponto de partida para uma jornada
transcultural, onde o vaqueiro dialoga com o herói homérico, e onde as
paisagens áridas se tornam metafísicas.
Feitosa
não está apenas interessado em descrever o Nordeste; ele quer abrir suas portas
para o mundo, mostrando que as culturas regionais podem, e devem, dialogar com
tradições globais. Essa visão é particularmente evidente na maneira como ele
lida com os mitos gregos, transformando-os em metáforas para as condições de
vida no sertão. O resultado é uma poesia que, embora enraizada em uma realidade
local, possui uma ressonância universal.
Em
“Psi, a penúltima”, o sertão é, além de um espaço de resistência, um território
de sabedoria, onde os desafios da natureza e da vida cotidiana são enfrentados
com uma filosofia própria, mas que, de certa forma, ressoa com os ensinamentos
da antiguidade clássica. A figura do sertanejo é elevada ao nível de um
filósofo prático, cuja luta pela sobrevivência é, por si só, uma forma de
sabedoria existencial. Feitosa constrói essa imagem de forma a universalizar a
experiência sertaneja, vinculando-a a tradições filosóficas e poéticas que
remontam aos gregos antigos.
A
fusão entre o Nordeste e a Grécia, na obra de Feitosa, não é uma simples
apropriação de referências eruditas, mas uma transformação profunda da paisagem
nordestina em um campo de reflexão filosófica e mítica. Essa simbiose literária
amplia a relevância da poesia de Feitosa, que não se contenta em ser um porta-voz
de uma cultura local, mas se apresenta como um poeta capaz de dialogar com
tradições universais e de propor novas formas de pensar a relação entre o homem
e seu ambiente.
A
obra de Soares Feitosa, particularmente “Psi, a penúltima”, revela um poeta em constante
busca pela transcendência cultural. Ao se denominar “multinordestino”, Feitosa
indica a multiplicidade de suas influências e sua capacidade de integrar mundos
distintos em sua poesia. O sertão nordestino, em sua obra, se transforma em um
palco mítico, onde as vozes do passado grego ecoam entre os sertanejos
contemporâneos, criando uma sinfonia poética que transcende as fronteiras do
tempo e do espaço.
Feitosa
nos convida a repensar o Nordeste não como um espaço fixo e estático, mas como
um lugar dinâmico, em constante diálogo com o mundo, onde as tradições locais e
as referências universais se encontram e se transformam. Essa fusão entre o
regional e o global, o sertão e a Grécia, redefine não apenas a identidade
cultural nordestina, mas também o papel da poesia como um veículo de
transcendência e de encontro entre culturas.
𝐀 𝐋𝐢𝐧𝐠𝐮𝐚𝐠𝐞𝐦 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐄𝐱𝐩𝐞𝐫𝐢ê𝐧𝐜𝐢𝐚 𝐒𝐞𝐧𝐬𝐨𝐫𝐢𝐚𝐥
No
livro “Psi, a penúltima”, Soares Feitosa revela um domínio da linguagem
poética, transformando a leitura em uma experiência sensorial profunda. O autor
transcende a função meramente comunicativa da palavra, empregando-a como uma
ferramenta capaz de evocar imagens vívidas e sentimentos intensos. Sua poética,
densa em imagens concretas, leva o leitor a experimentar o sertão nordestino de
maneira visceral, como se cada verso carregasse o peso do calor, da aridez e da
aspereza do solo.
Feitosa
cria um elo íntimo entre a palavra e os sentidos, destacando-se especialmente
pela maneira como transporta o leitor para o cenário que descreve. O sertão de
Feitosa não é apenas um espaço geográfico; é uma dimensão sensorial e
emocional. O cheiro da terra seca, o calor abrasador do sol, o toque áspero da
vegetação ressecada — todos esses elementos compõem um quadro que não só
descreve, mas envolve o leitor em uma experiência quase tátil.
Essa
abordagem sensorial da linguagem faz de “Psi, a penúltima” uma obra que
transcende a narrativa e o poético tradicionais. Feitosa não se limita à
palavra como instrumento de descrição ou análise; ele a transforma em um
veículo de imersão, em que os sentidos são constantemente estimulados. A
leitura se transforma, assim, em uma vivência, e o sertão, em um personagem
ativo que dialoga diretamente com o leitor.
Essa
força expressiva está ancorada na tradição oral nordestina, onde a palavra tem
uma presença concreta, quase material. Soares Feitosa bebe dessa tradição e a
revitaliza com uma modernidade que não rompe com o passado, mas o reconstrói. A
imagética de seu texto é, portanto, profundamente enraizada no Nordeste, não
apenas contemplado de longe, mas sentido no corpo e na alma.
A
capacidade de Feitosa de conjurar sensações tão palpáveis através da palavra
reflete seu entendimento de que a linguagem poética deve ser vivida e não apenas
lida. “Psi, a penúltima” é, em essência, uma obra que transforma o leitor em
habitante temporário do sertão, conferindo-lhe a sensação de caminhar sob o sol
escaldante, sentir o vento seco e ouvir o silêncio que reina sobre a vastidão
da paisagem.
Essa
imersão não é gratuita, mas parte de uma estratégia estética que explora os
limites da linguagem. Ao criar uma experiência sensorial, Soares Feitosa
desafia o leitor a ver além das palavras, a penetrar naquilo que não pode ser
descrito, mas apenas sentido. A palavra, em seu texto, é um portal para um
universo em que a percepção se torna a principal ferramenta de compreensão.
“Psi,
a penúltima” é uma celebração da palavra, onde a linguagem ganha corpo,
textura, cheiro e cor. Feitosa revela, assim, que a poesia não se esgota em sua
superfície, mas é um caminho para experiências profundas, nas quais o leitor é
convidado a sentir o sertão como uma realidade tangível, rica e pulsante. É uma
obra que nos lembra do poder da linguagem de transcender o abstrato e nos
colocar em contato direto com o mundo físico — e, através dele, com o mundo das
emoções.
𝐎 𝐂𝐨𝐭𝐢𝐝𝐢𝐚𝐧𝐨 𝐍𝐨𝐫𝐝𝐞𝐬𝐭𝐢𝐧𝐨 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐌𝐚𝐭é𝐫𝐢𝐚 É𝐩𝐢𝐜𝐚
Em
“Psi, a Penúltima”, Soares Feitosa realiza uma façanha poética: eleva o
cotidiano nordestino à condição de matéria épica. Seus versos, construídos com
uma linguagem despojada e acessível, transformam o simples e o corriqueiro em
símbolos grandiosos de lutas universais. O poeta captura o pulsar da vida
cotidiana do sertão — um universo aparentemente insignificante, mas que, nas
mãos de Feitosa, revela profundidade e significados existenciais.
A
obra carrega uma complexidade que vai além da aparente simplicidade de seus
temas. O menino com o balde, por exemplo, não é apenas uma figura infantil
carregando água; ele se transforma em um arquétipo de resistência, enfrentando
os desafios de um cotidiano árido e impiedoso. Da mesma forma, as raposas
famintas não são meros animais em busca de sustento; são metáforas para a luta
incessante pela sobrevivência, uma constante no sertão nordestino. Em Feitosa,
o sertão ganha contornos de epopeia, onde o heroísmo não está nas grandes
batalhas ou em gestos extraordinários, mas nas pequenas ações diárias,
impregnadas de sacrifício.
A
transformação do banal em épico que Feitosa propõe reflete uma visão artística
que vê no particular uma representação do universal. Ao poetizar a vida
nordestina, o autor revela que as batalhas do cotidiano — por água, por comida,
por dignidade — são, na verdade, as batalhas fundamentais da existência. O
sertanejo, em sua simplicidade, representa o herói trágico de uma odisseia
moderna, que luta contra as forças da natureza, da injustiça social e do tempo
implacável.
Essa
dimensão épica do cotidiano é amplificada pela estrutura dos poemas, de formas
clássicas de narração heroica, mas com um toque de modernidade e de oralidade.
A escolha de uma linguagem rica em regionalismos não apenas situa o leitor no
contexto específico do Nordeste, mas também enriquece a textura poética da
obra. Feitosa não se limita a retratar o sertão; ele o vivifica, dando voz e
corpo a uma cultura vibrante, resistente, que transcende as limitações
geográficas e históricas para se tornar uma expressão do nordestino em sua
forma mais pura.
O
uso do épico por Feitosa vai além de uma simples celebração do cotidiano. Ele
utiliza esses elementos como símbolos de uma luta maior, uma jornada heroica
pela sobrevivência, pela dignidade e pelo sentido da vida. O poema se torna,
assim, uma forma de resistência poética, onde o nordestino, tantas vezes
marginalizado e invisível, ocupa o centro do palco literário, sendo enaltecido
em sua luta diária. Essa escolha estética não só enriquece o significado da obra
como também a transforma em um ato político, um gesto de afirmação da cultura e
da identidade nordestina.
Em
“Psi, a Penúltima”, o tempo parece ter outra densidade. O ritmo da vida no
sertão, marcado pelas estações secas e chuvosas, pelo trabalho árduo e pela
espera paciente, imprime-se na cadência dos versos de Feitosa. A simplicidade
das imagens é enganosamente modesta; sob a superfície, há uma profundidade que
evoca questões filosóficas e existenciais universais. Ao transformar o
cotidiano nordestino em matéria épica, Feitosa aponta para a universalidade
dessas experiências, mostrando que o sertão nordestino é o palco de dramas
humanos que se repetem em qualquer parte do mundo.
Feitosa
não romantiza o sertão; ao contrário, ele o retrata em sua dureza, com suas
dificuldades e seus desafios. Contudo, é precisamente nessa dureza que ele
encontra a grandeza. O sertão, em sua aridez e solidão, é o terreno onde o ser
humano se defronta com seus próprios limites e, ao fazê-lo, encontra o heroísmo
em si mesmo. O épico em Feitosa, portanto, não está nas grandes façanhas, mas
nas pequenas ações que, somadas, constroem a vida e a dignidade.
“Psi,
a Penúltima” é, assim, uma obra que desafia as convenções literárias, ao
transformar o que poderia ser visto como insignificante em matéria de grandeza
poética. Ao fazer isso, Soares Feitosa reafirma o poder da poesia em revelar a
profundidade do cotidiano, transformando o particular em universal e o comum em
épico.
𝐀 𝐄𝐱𝐩𝐥𝐨𝐫𝐚çã𝐨 𝐝𝐨𝐬 𝐋𝐢𝐦𝐢𝐭𝐞𝐬 𝐝𝐚 𝐋𝐢𝐧𝐠𝐮𝐚𝐠𝐞𝐦
Soares
Feitosa é um poeta cuja obra se caracteriza por uma constante experimentação
com os limites da linguagem. Em “Psi, a penúltima”, ele nos convida a uma
viagem através da maleabilidade do significado, utilizando a simbologia e os signos
como ferramentas para expandir o entendimento poético. O título da obra, ao
evocar a letra grega “psi” (Ψ), sugere um diálogo direto com as profundezas do
saber e da psique, assim como com a ideia de uma permanência que está sempre à
beira do último passo, sem nunca alcançá-lo por completo.
A
escolha da letra “psi” como elemento central não é arbitrária. No contexto
grego, o símbolo Ψ evoca associações com a psicologia e com a mente, um domínio
que explora tanto as profundezas racionais quanto as irracionais. Feitosa, no
entanto, vai além das definições convencionais. Para ele, a letra “psi”
representa uma força subjacente de movimento e de transição. Ao utilizá-la como
metáfora poética, o poeta desafia o leitor a repensar a noção de uma finalidade
na linguagem e no próprio ato de escrever. “Psi” é, para Feitosa, uma metáfora
da busca inacabável, da impermanência do pensamento diante da complexidade da
existência.
O
subtítulo “a penúltima” adiciona uma camada adicional de interpretação. No
pensamento ocidental, a penúltima posição é muitas vezes negligenciada; ela não
tem o brilho do primeiro lugar nem o impacto do último. Porém, na poesia de
Feitosa, a penúltima se torna essencial, porque representa o momento da espera,
da transição e da antecipação. É o intervalo entre o que foi dito e o que ainda
está por dizer. Através dessa ideia, Feitosa desafia a percepção linear da
linguagem, sugerindo que a poesia nunca deve ser lida ou entendida como algo
definitivo, mas como uma construção aberta e em constante mudança.
A
linguagem, para Feitosa, é algo vivo, mutável e profundamente simbólico. Sua
inclusão de caracteres gregos, além de múltiplas referências culturais e
linguísticas, revela uma consciência de que as palavras nunca são fixas. A
exploração da linguagem em “Psi, a penúltima” remete à tradição modernista, na
qual o significado é constantemente quebrado e reconstruído. No entanto,
Feitosa vai além do modernismo ao infundir sua poesia com um senso de
multiplicidade, onde cada palavra ou símbolo abre espaço para uma infinidade de
interpretações.
O
ponto central da obra de Feitosa é a jornada que nunca alcança um destino
final. A poesia não busca verdades absolutas; ela é uma tentativa contínua de
capturar o que é, por natureza, incapturável. Através dessa visão, “Psi, a
penúltima” adota uma perspectiva filosófica, na qual a busca é mais importante
do que o encontro de respostas definitivas. O poeta nos lembra de que a arte,
assim como a vida, é uma série de experiências transitórias e inacabadas.
Feitosa
desafia seus leitores a não buscar respostas fáceis em seus poemas. A inclusão
de símbolos como “psi” e a escolha pela “penúltima” posição sugerem que a
interpretação nunca será completamente estática ou conclusiva. É uma obra que
provoca, que exige múltiplas leituras e que permite ao leitor fazer parte de um
processo dialético, onde o entendimento é construído a partir da exploração de
limites e fronteiras linguísticas.
“Psi, a penúltima”, de Soares Feitosa, é uma
obra que reflete a inquietação de um poeta comprometido com a constante
experimentação da linguagem. A exploração dos limites do símbolo e da forma é,
para Feitosa, uma maneira de desafiar tanto a si mesmo quanto seus leitores a
não se contentarem com o óbvio. O uso da letra “psi” como símbolo de uma busca
inacabável e a ênfase na “penúltima” como estado de transição mostram que, para
o autor, a poesia é um processo sempre inacabado, uma jornada em direção ao que
está além das palavras.
𝐎 𝐃𝐢á𝐥𝐨𝐠𝐨 𝐞𝐧𝐭𝐫𝐞 𝐄𝐫𝐮𝐝𝐢𝐭𝐨 𝐞 𝐏𝐨𝐩𝐮𝐥𝐚𝐫
Em
“Psi, a penúltima”, Soares Feitosa alcança um feito singular dentro da
literatura contemporânea brasileira: a junção harmoniosa entre o erudito e o
popular. Sua obra, ao mesmo tempo sofisticada e profundamente conectada às
raízes culturais do Nordeste, exemplifica a riqueza e a multiplicidade da
cultura brasileira de forma admirável.
Feitosa
realiza essa fusão de maneira orgânica, sem forçar fronteiras artificiais entre
o que se convencionou chamar de alta e baixa cultura. Para ele, o conhecimento
acadêmico, as tradições clássicas e a literatura universal coexistem
naturalmente com as expressões populares, sejam elas as histórias orais, os
causos, ou as manifestações linguísticas próprias da região nordestina. Essa
habilidade em transitar por diferentes registros, mantendo a unidade da obra, é
uma das marcas centrais do estilo de Feitosa.
No
seu texto, podemos perceber um diálogo intertextual com grandes nomes da
tradição literária ocidental. As referências a mitologias, a filósofos e a
autores clássicos são recorrentes, mas jamais soam elitistas ou desconectadas
da realidade vivida. Feitosa consegue traduzir esses elementos eruditos para um
público mais amplo ao mesclá-los com o lirismo do sertão, a cadência da fala
popular e os ritmos da terra nordestina.
Essa
fusão se reflete tanto no uso da linguagem quanto na estrutura de suas narrativas
e poemas. A linguagem em “Psi, a penúltima” não é apenas um meio de
comunicação, mas um elemento vivo, que se molda de acordo com as necessidades
da obra. Há um refinamento estético evidente nas construções, mas esse
refinamento não se impõe de forma rígida; ele flui com naturalidade, permitindo
que expressões populares, regionalismos e a oralidade ocupem espaço ao lado de
termos cultos, criando um vocabulário híbrido que é, ao mesmo tempo, inovador e
familiar.
Feitosa,
ao optar por essa junção de tradições, consegue criar uma obra que dialoga com
públicos diversos. Para o leitor que aprecia as nuances e camadas da erudição,
há profundidade e intertextualidade a serem desvendadas; para o leitor que se
sente mais à vontade com a simplicidade do falar cotidiano, há a acolhida da
linguagem acessível e da representação fiel da cultura popular. Essa
diversidade faz com que a obra funcione em múltiplos níveis, sem alienar ou
excluir nenhum dos seus leitores.
O
ponto de convergência entre o erudito e o popular em Feitosa não é apenas uma
questão formal, mas também uma manifestação filosófica. Ele parece acreditar
profundamente na ideia de que o saber e a cultura não devem estar restritos a
um nicho de iniciados, mas sim fazer parte da vivência de todos. Em “Psi, a
penúltima”, essa visão ganha corpo em metáforas, na construção dos temas
abordados.
A
cultura popular nordestina, com seus ritmos próprios e suas peculiaridades,
ganha espaço ao lado de referências às grandes tradições literárias ocidentais.
O sertão e o épico encontram-se em pé de igualdade; ambos são reconhecidos por
sua importância e valor simbólico. O sertanejo, figura central em várias
passagens da obra, é elevado à categoria de herói épico, não por suas
conquistas grandiosas, mas por sua luta diária e sua sabedoria, que transcende
o formalismo acadêmico.
Ao
propor essa fusão, Feitosa está não apenas reafirmando a multiplicidade da
cultura brasileira, mas também sugerindo que essa multiplicidade deve ser
celebrada em sua plenitude. Ele nos convida a ver que não há hierarquia
cultural rígida: o popular e o erudito se complementam e, juntos, formam um
todo que é mais rico do que a soma de suas partes.
“Psi,
a penúltima” é, portanto, uma obra que desafia convenções literárias ao propor
uma nova forma de se pensar a literatura brasileira. O diálogo que Feitosa
constrói entre o erudito e o popular não é apenas uma escolha estética, mas uma
declaração sobre a natureza inclusiva da arte e da cultura. Ao fazer isso, ele
nos oferece uma visão mais ampla e inclusiva daquilo que constitui nossa
identidade literária, mostrando que o Brasil, com sua rica diversidade, tem
muito a dizer tanto nas esferas mais acadêmicas quanto nas ruas e vilarejos do
sertão.
A
capacidade de Feitosa de realizar esse diálogo sem perder a autenticidade nem o
rigor literário torna “Psi, a penúltima” uma obra que, ao mesmo tempo,
homenageia o passado e aponta para o futuro, mostrando que a literatura pode –
e deve – ser um espelho da diversidade cultural que a origina.
𝐀 𝐏𝐨𝐞𝐬𝐢𝐚 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐅𝐨𝐫𝐦𝐚 𝐝𝐚 𝐄𝐱𝐢𝐬𝐭ê𝐧𝐜𝐢𝐚
Em
“Psi, a penúltima”, Soares Feitosa nos oferece uma obra em que a poesia
transcende a mera expressão literária, transformando-se em um meio de
existência. O texto se configura como uma exploração contínua do que significa
viver, ser, e estar no mundo, um convite ao leitor para participar dessa
jornada poética. Para Feitosa, a poesia não se limita à página impressa; ela se
transforma em experiência, afetando diretamente as formas de perceber e
existir.
Feitosa
constrói em “Psi, a penúltima” uma poética onde a palavra não é apenas veículo
de sentido, mas força motriz de um modo de ser. Sua escrita sugere que a poesia
não se realiza completamente enquanto produto fixo, mas que se manifesta na
interação entre a obra e o leitor. A palavra, aqui, é viva, ressignificada a
cada leitura. Através da constante renovação, a poesia se torna um ato de
reinvenção pessoal e coletiva.
Para
Feitosa, o ato de escrever vai além da simples criação de versos; ele é, de
fato, um processo de transformação do próprio poeta. Escrever é viver, e viver
é um ato poético contínuo. A poesia, em “Psi, a penúltima”, é apresentada como
o meio pelo qual o autor recria o mundo ao seu redor, desafiando o conceito de
uma realidade estática e propondo uma visão dinâmica da existência.
A
obra de Feitosa não foge das contradições da vida, mas as acolhe como parte
essencial da condição humana. A poesia, para ele, é um campo fértil onde essas
contradições florescem, e “Psi, a penúltima” reflete esse conflito. O poeta
celebra a vida em toda sua exuberância, mas também reconhece suas limitações,
suas dores, e seus paradoxos. Assim, o leitor é levado a refletir sobre a natureza
da vida e a inevitabilidade da morte, temas que atravessam a obra.
Um
dos aspectos mais intrigantes da poética de Feitosa é a relação entre palavra e
silêncio. Em “Psi, a penúltima”, a poesia não se define apenas pelo que é dito,
mas pelo que é silenciado. O silêncio, aqui, atua como uma forma de linguagem
em si, sugerindo o indizível, o que está além da compreensão e da articulação.
Nesse sentido, Feitosa nos lembra que, por mais poderosa que seja a palavra,
ela nunca é suficiente para capturar plenamente a totalidade da existência.
Através
da escrita, Feitosa engaja-se em um processo de renascimento constante. Em
“Psi, a penúltima”, cada poema parece ser um rito de passagem, onde o antigo é
deixado para trás e o novo emerge. Essa transformação contínua é uma parte
central da obra, refletindo a visão do poeta de que a vida e a poesia estão em
fluxo perpétuo. O título, “Psi, a penúltima”, sugere essa ideia de
incompletude, de que sempre haverá uma nova palavra, um novo verso, uma nova
experiência esperando para ser descoberta.
Feitosa
explora, em sua obra, a poesia como um caminho para o autoconhecimento. Ao
longo de “Psi, a penúltima”, o leitor é convidado a uma jornada introspectiva,
em que as palavras do poeta servem como espelhos que refletem a alma. A poesia
aqui se configura como um espaço de questionamento, onde o poeta e o leitor se
encontram.
Outra
característica marcante da obra de Feitosa é a fusão entre o cotidiano e o
metafísico. Em “Psi, a penúltima”, eventos comuns são elevados a um nível quase
transcendente, onde pequenos gestos ou cenas ordinárias são transformados em
momentos de profunda revelação. A poesia torna-se, assim, um meio de conectar o
mundano ao eterno, fazendo com que cada detalhe adquira um novo significado.
Soares
Feitosa se posiciona, em sua obra, como um mediador entre o mundo e a palavra.
Ele não pretende impor uma visão, mas abrir caminhos para que o leitor descubra
suas próprias respostas. A poesia, em “Psi, a penúltima”, é uma ferramenta para
decifrar o mistério da vida, mas também para celebrá-lo em sua opacidade.
Feitosa nos lembra que a arte, como a vida, não precisa ser compreendida
completamente para ser apreciada.
Embora
profundamente original, a obra de Feitosa dialoga com várias tradições
literárias, de modo que “Psi, a penúltima” se insere em um vasto universo de
referências poéticas. Há ecos de poetas modernistas e de movimentos
contemporâneos, mas também uma influência clara da oralidade e das raízes
culturais brasileiras. Essa fusão de influências confere à sua obra uma riqueza
cultural e literária que a distingue no cenário poético atual.
Ao
final de “Psi, a penúltima”, o leitor se vê diante de uma obra que transcende o
tempo e o espaço, onde a poesia se configura como uma forma de permanência.
Para Soares Feitosa, a poesia não é apenas algo que se lê, mas algo que se
vive. E assim, a obra não termina com a última palavra, mas continua a
reverberar no leitor, convidando-o a refletir sobre sua própria relação com a
arte e a palavra.
𝐀 𝐑𝐞𝐜𝐞𝐩çã𝐨 𝐂𝐫í𝐭𝐢𝐜𝐚 𝐞 𝐨 𝐑𝐞𝐜𝐨𝐧𝐡𝐞𝐜𝐢𝐦𝐞𝐧𝐭𝐨
A
obra “Psi, a penúltima”, de Soares Feitosa, teve uma recepção entusiástica e
analítica por parte de críticos renomados como Millôr Fernandes, Lêdo Ivo, e
Jorge Amado. Esses nomes de peso na literatura e na crítica brasileira não
apenas reconheceram a profundidade e a originalidade da obra, mas também
destacaram seu impacto na renovação da poesia contemporânea no Brasil.
Millôr
Fernandes, conhecido por sua sagacidade e abordagem irreverente, referiu-se à poesia
de Feitosa como “buliçosa e arrelienta”. Esse elogio sublinha o caráter
provocativo e inquieto de “Psi, a penúltima”, que desafia as convenções
tradicionais da poesia brasileira. Feitosa, com sua habilidade de brincar com a
linguagem e a estrutura poética, foi visto por Millôr como alguém que vai além
da mera experimentação formal, usando seu estilo para questionar as fronteiras
do discurso poético. Ao trazer à tona uma poesia que incomoda e estimula,
Feitosa atraiu a atenção de uma crítica acostumada a uma certa linearidade
estética, que, no entanto, não pôde ignorar a força disruptiva de sua obra.
Para
Lêdo Ivo, um dos grandes nomes da poesia modernista brasileira, a obra de
Feitosa carrega um potencial transformador. Ivo reconheceu o lirismo contido na
obra de Feitosa, elogiando sua capacidade de mesclar o popular e o erudito de
maneira singular. “Psi, a penúltima” se insere, segundo Ivo, em uma tradição
poética que ao mesmo tempo homenageia e subverte as raízes da poesia
nordestina. Feitosa utiliza o ritmo, o sotaque e as paisagens do sertão em suas
composições, mas o faz com um senso de humor e ironia que beira o desafiador,
proporcionando ao leitor uma reflexão sobre as complexidades da cultura e
identidade brasileira. Lêdo Ivo viu, assim, em “Psi, a penúltima”, uma obra de
resistência e afirmação de uma nova voz poética que não se contenta com o
lugar-comum.
Jorge
Amado, autor de renome internacional, também se manifestou sobre a obra de
Soares Feitosa. Para Amado, a poesia de Feitosa é uma celebração das narrativas
e personagens populares do Brasil, mas com um olhar afiado e crítico sobre a
sociedade. A obra, de acordo com o romancista, é uma crônica poética dos
dramas, alegrias e tragédias que compõem o mosaico brasileiro. Amado
identificou em “Psi, a penúltima” uma força narrativa que conecta a poesia de
Feitosa ao romance social, transformando suas composições em retratos vívidos
da vida brasileira. Esse elogio vindo de um mestre da narrativa social é um
sinal claro do alcance da obra de Feitosa, que transcende os limites da poesia
e ressoa com uma pluralidade de leituras.
Esses
três críticos, cada um com seu estilo e perspectiva, convergiram em um ponto
crucial: Soares Feitosa consegue criar uma poesia que é local e universal,
profundamente enraizada no Brasil, mas capaz de dialogar com temas atemporais da
literatura. Sua originalidade reside não apenas na forma como estrutura seus
versos, mas na maneira como insere o leitor em um espaço poético que é, ao
mesmo tempo, familiar e desorientador.
Além
de sua contribuição estética, “Psi, a penúltima” também traz à tona questões
importantes sobre a relação entre o poeta e a crítica literária. A obra não é
simplesmente um exemplo de inovação formal; é uma declaração da liberdade
criativa e uma rejeição consciente dos rótulos que muitas vezes aprisionam a
produção poética. Nesse sentido, o reconhecimento de críticos como Millôr
Fernandes, Lêdo Ivo, e Jorge Amado é, em si, um testemunho da capacidade de
Soares Feitosa de transcender as convenções e estabelecer-se como uma voz no
cenário literário brasileiro.
A
crítica, ao reconhecer essa inovação, ajudou a consolidar Soares Feitosa como
um dos grandes renovadores da poesia contemporânea. A recepção de “Psi, a
penúltima” não foi apenas um aceno de aprovação; foi um sinal de que a poesia
brasileira havia sido irrevogavelmente alterada por essa obra que, mesmo
“penúltima”, parece ser definitiva em seu impacto.
Essa
recepção crítica, portanto, consagra “Psi, a penúltima” como uma obra
fundamental na trajetória de Soares Feitosa, cujas contribuições para a poesia
brasileira continuam a ressoar, inspirando tanto novos poetas quanto aqueles já
estabelecidos.
𝐕𝐢𝐜𝐞𝐧𝐭𝐞 𝐅𝐫𝐞𝐢𝐭𝐚𝐬
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