Andrea Trompczynski |
Anteontem eu assistia a novela América, quando apareceu a
Mariana Ximenes dançando. (O senhor ali do fundo, o intelectual de gola rulê,
por favor, não me atire tomates. Muito menos esse volume de Guerra e
Paz aí. Vai, vai, resigna-se, homem! Todo mundo assiste novela.) Onde eu
estava mesmo? Ah, sim a Mariana Ximenes dançava. Era a coisa mais linda que já
vi. Não, não sou homossexual (apesar de ter desejado muito o ser, ao conhecer certos homens.
O que, não adiantaria em nada, dizem-me serem os problemas idênticos). Mas, não
é preciso ser homossexual para reconhecer a beleza de Mariana Ximenes. E o que
quase me matou de inveja: ela dança. Com o corpo todo, sabe? Tem uma graça
imensa na maneira como ela dança.
Sou uma mulher que não dança. Uma meia-mulher. Porque, não dançar é um atestado de feminilidade baixa nos dias de hoje. Não concordo, mas é assim, para os outros. Todas as vezes em que tentei dançar, senti como nunca antes, o peso da gravidade. Meus joelhos emperravam. Meus braços pareciam ter bolas de ferro nas pontas. Meu pescoço endurecia, na sensação de pesadelo que é a de todos estarem olhando pra mim. Se fechava os olhos, eu me olhava. Tinha a consciência de como cada pedacinho do meu corpo era atrapalhado e sem graça. E, o pior, eu não sabia que cara fazer. Que cara se deve fazer quando dançamos? De felicidade, de sedução, de relaxamento, de distração? Eu não conseguia definir, em todas as minhas tentativas de dança, que cara eu tinha que ter. Olhava as outras pessoas, e, pareciam estar à vontade com as caras que escolheram fazer.
Uma amiga disse-me que tenho, certamente, couraças emocionais que me impedem de dançar. Nos ombros, porque carrego o mundo nas costas. No pescoço, pelo peso de raciocinar. Nos quadris, por medo de uma paixão avassaladora. Nas pernas, por comodismo, preguiça de ir. Nos braços, que cruzo no tórax, ela disse ser um movimento de proteção e medo de revelar os sentimentos no meu peito. Também explicou-me que, posso livrar-me delas com auto-conhecimento e meditação transcendental. Mas, eu penso que não deve haver um problema sério em continuar com as minhas couraças. Gosto delas. São quentinhas e me protegem. E tão, tão pesadas como uma armadura medieval, impedem que meus pés andem nas nuvens.
Mas, uma vez, dancei. E foi bom. Só havia uma pessoa olhando. Descobri naquele dia, um zíper escondido que deixava cair as couraças, como as roupas. Ufa, nem foi preciso fazer meditação transcendental. Usei minha própria cara, como ele usou a dele.
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Andrea Trompczynski – O livro é um prazer sensorial para mim.
Capas antigas, o cheiro, anotações. Meu sonho de consumo é uma primeira edição
de Finnegan's Wake, com anotações, nas margens, da Lígia Fagundes
Telles. Não há arte maior que a literatura. Não há arte mais intensa e nem mais
difícil. É a única e verdadeira arte. Escrever. Vou em teatro, ouço música,
sim. Mas até a HQ para mim está acima da música. Não adianta. No princípio era
o verbo. Os homens são minha forma favorita de design. Não a
humanidade, os homens. Anti-feminista convicta, acredito que as super-mulheres
perdem o que há de melhor nos homens. Passei por essas fases de queimar sutiã e
hoje vejo que certa estava minha avó, não se deve lutar contra a
natureza. Tenho uma estranha sensação de déjà-vu quando
conheço coisas novas, é sempre como se já tivesse visto. Como se nada fosse
muito novo. Por ter andado por muitos lugares e vivido tantas coisas sem sair
do meu quarto, agora finalmente vendo "de verdade e se mexendo" o
mundo, não me deslumbro, não me fascino. Prefiro os livros.
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