domingo, maio 01, 2011

Em defesa da Crítica

Andrea Trompczynski
"Uma tolice dita por um gênio continua a ser uma tolice"
(Bertrand Russel)

O jornalista gaúcho Juremir Machado da Silva foi convidado a retirar-se do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, porque escreveu um comentário que dizia “estou indeciso entre comprar meias ou um livro do Luís Fernando Veríssimo para presentear um amigo no Natal”. Veríssimo zangou-se e pediu para que o Zero escolhesse um dos dois. Adivinhem quem saiu?

Veríssimo é engraçado, inteligente, genial. Mas está padronizado. Alguns autores encontram uma fórmula de sucesso e usam-na exaustivamente, chamam-na estilo. As domingueiras de LFV distribuídas pela Agência O Globo poderiam facilmente ser substituídas por coisa muito melhor, porém escritas por mortais indignos de “améns” e "hosana nas alturas". Então: foi escrito pelo Veríssimo? Ah, é um gênio, sem comentários, nem precisamos criticar, que heresia.

Hoje todo mundo é escritor e o mau-gosto, o "ser engraçadinho" e apesquisa googleniana são considerados cultura (eu ouvi, com esses ouvidos que a terra há de comer, uma jornalista do SBT dizendo que estudou tal assunto "a tarde inteira no Google"). Engole-se qualquer coisa porque o crítico é chamado de um "escritor (ou jornalista ou autor ou escultor ou pintor) que não deu certo", portanto, "não sabe escrever e muito menos criticar".

Um leitor reclamava na Gazeta do Povo (jornal do Paraná, de 17 de outubro) de dois professores e críticos de arte que tiveram a ousadia de reclamar que faltava um músculo na escultura do Davi de Michelangelo, e terminava a carta com a “primorosa” frase a obra será sempre lembrada, o crítico logo esquecido.

Alguém tinha que falar, o músculo não estava lá e ponto final.

Outra celebridade sem críticos, Carlos Heitor Cony, no último domingo na FolhaNão tenho certeza, mas foi em 1972 ou 1973, quando o barril de petróleo chegou a US$34Também não tenho certeza, mas no embargo.... Não tem certeza? Pelo menos a jornalista do SBT tinha procurado no Google. Juremir Machado escreve muito, muito melhor. Mas tem certezas, o que não está muito na moda.

Hemingway, o homem
Por quem os sinos dobram é mediano comparado a O sol também se levanta e Adeus às armas, mas é o melhor da literatura-reportagem de Ernest Hemingway. Ele cobria e -pasmem- lutava voluntariamente nas trincheiras da Guerra Civil Espanhola em 1938, a carnificina.

Robert Jordam é um inglês perito em bombas que deve explodir a ponte que possibilitava o acesso dos nacionalistas à cidade. Apaixona-se por Maria, a mulher bonita e educada que havia sido torturada em Valladolid e salva pelos rudes ciganos. Maria era diferente, culta, delicada, a "fêmea". Jordam balança em suas antigas convicções e passa a questionar a idéia da guerra pela paz, e estes são os melhores momentos do livro, seus pensamentos. Hemingway escreve de maneira “seca” e é explicável as cenas das matanças ficarem para sempre na memória: ele escrevia apenas o que havia vivido. 

Era um homem, e como homem, um poço de defeitos. O espantoso é descobrir depois de ler suas obras que o autor tinha uma personalidade odiosa. Seus biógrafos têm aversão à ele. Um invejoso, quando seu melhor amigo Scott Fitzgerald publica o Grande Gatsby, humilha-o solenemente, chamando-o débil, um talento desperdiçado. Beberrão, espojou-se na lama, raspou a cabeça, fez escândalos. E Fitzgerald, masoquista que só ele, perdoava "Papa" Hemingway: Há um complexo de inferioridade que surge quando alguém sente que não faz tudo o que poderia. Ernest bebe exatamente por isso

Profecias para Fernando Sabino
Em cinquenta anos O Encontro MarcadoO Grande Mentecapto e O Menino no Espelho ainda serão lidos. A dor com a morte do pai que Eduardo Marciano sofre em O Encontro Marcado foi a mais perfeita descrição da angústia (verdadeira angústia) que já li em toda minha vida. Seu livro Zélia, uma paixão, dito infeliz e oportunista pelos críticos será esquecido e seus clássicos lembrados. Mas que foi infeliz e oportunista, ah, isso foi.

CrussificadosO Show do Gongo
Crussificados iria fazer dois anos e foi uma das idéias mais engraçadas da internet. Sua missão era julgar, criticar e rotular blogs, e eram muito bons nisso. Tanto que os criadores perceberam que deveriam sair antes de tornarem-se repetitivos e entediantes. Venderam o blog, mudaram de assunto, mas ainda escrevem seu humor "escracho" e sem segundas intenções, em outro endereço: Cada Um Com Seus Problemas.

Justus, o aprendiz de Trump
Roberto Justus apresentará em novembro, na Record, a versão brasileira de O Aprendiz, de Donald Trump. O ganhador desse reality show, terá um emprego de pelo menos um ano com Justus, ano em que receberá R$250.000. Os princípios esperados que o candidato tenha são os mesmos de O Benfeitor: não ter princípios.

Espero que Justus não tenha que usar o mesmo penteado de Trump.


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Andrea Trompczynski – O livro é um prazer sensorial para mim. Capas antigas, o cheiro, anotações. Meu sonho de consumo é uma primeira edição de Finnegan's Wake, com anotações, nas margens, da Lígia Fagundes Telles. Não há arte maior que a literatura. Não há arte mais intensa e nem mais difícil. É a única e verdadeira arte. Escrever. Vou em teatro, ouço música, sim. Mas até a HQ para mim está acima da música. Não adianta. No princípio era o verbo. Os homens são minha forma favorita de design. Não a humanidade, os homens. Anti-feminista convicta, acredito que as super-mulheres perdem o que há de melhor nos homens. Passei por essas fases de queimar sutiã e hoje vejo que certa estava minha avó, não se deve lutar contra a natureza. Tenho uma estranha sensação de déjà-vu quando conheço coisas novas, é sempre como se já tivesse visto. Como se nada fosse muito novo. Por ter andado por muitos lugares e vivido tantas coisas sem sair do meu quarto, agora finalmente vendo "de verdade e se mexendo" o mundo, não me deslumbro, não me fascino. Prefiro os livros. 

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